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REINVENTANDO O BRASIL
Por Geraldo Luís Lino na Tribuna da Imprensa
A derrocada ética do governo Lula está fazendo dois grandes favores ao Brasil. Primeiro, escancarar de uma vez por todas o "jeitão brasileiro" de fazer política, na base do compadre, do clientelismo e do aparelhamento do Estado para a satisfação dos apetites dos diversos grupos que disputam o Poder. Segundo, assinar o ocaso dos "salvadores da pátria", aqueles líderes providenciais nos quais os brasileiros costumam depositar as esperanças de ver as políticas públicas colocadas a serviço do Bem Comum, apenas para vê-las rapidamente frustradas e retornar à fila das expectativas de um futuro que nunca chega.
Tudo isso acontece em meio a uma das mais graves crises da nossa história, se não a mais grave delas, cujo desfecho vai determinar o futuro do País nas próximas décadas. Salta aos olhos que, em meio a uma crise civilizatória global, vivemos um impasse semelhante ao experimentado nas últimas décadas do século XIX, com o esgotamente do modelo sócio-econômico baseado na escravidão - o qual, mal resolvido pelas classes dirigentes e elites da época, está na raiz de grande parte das profundas desigualdades sócio-econômicas que hoje representam um pesadíssimo fardo a ameaçar as perspectivas do País.
Naquele momento, era patente para os espíritos mais lúcidos que o fim da escravidão teria que ser acompanhado por medidas concretas para assegurar aos libertos condições mínimas da adaptação às novas vidas. Por isso, abolicionistas como Joaquim Nabuco e André Rebouças - e, sabe-se hoje, a própria princesa Isabel - propunham que cada família liberta recebesse do governo um pequeno lote de terra para recomeçar a vida.
Tendo sido a proposta rechaçada pelas oligarquias dominantes e seus representantes políticos, criou-se uma vasta camada de indivíduos desprovidos de meios para se inserir devidamente em uma economia que já começava a se diversificar, com o início da industrialização, e incapaz de constituir uma cidadania apta a contribuir para a construção de uma nação moderna.
Hoje, vivemos um dilema parecido, com a submissão quase total das políticas públicas ao rentismo e à financeirização da economia e a apropriação maciça dos frutos dos esforços da população - aí incluída grande parte do empresariado - pelo setor financeiro, cujos lucros não cessam de crescer.
Sem exagero, pode-se afirmar que a esmagadora maioria dos brasileiros encontra-se escravizada à usura. Da mesma forma, é evidente que a continuidade desse modelo não oferece qualquer perspectiva de um futuro promissor ao País, além do aprofundamento das desigualdades e das tensões sociais delas decorrentes, entre as quais a pandemia de violência que grassa nas cidades maiores.
É preciso, pois, "reinventar" o Brasil. Porém, tal processo terá que ocorrer de baixo para cima, com a conscientização e mobilização de parcelas crescentes da sociedade. Não dá para esperar que o processo político-eleitoral produza um novo candidato a "salvador da pátria", para reiniciar o ciclo vicioso de esperanças desfeitas.
Ao contrário, será preciso que a conscientização/mobilização se dê em torno de uma pauta de diretrizes que possibilite a recolocação do País no caminho do sensolvimento e de um progresso realmente benéfico para todos os segmentos da sociedade, daí poderão surgir as novas lideranças, inclusive políticas, de que necessitamos.
Por isso, cada um de nós terá que assumir responsabilidades coletivas, além dos seus interesses pessoais e familiares. Felizmente, esse processo parece já estar em marcha, em uma multiplicidade de organizações das mais diversas: associações comunitárias, organizações não-governamentais, entidades sindicais e empresariais e outras, onde, pelas motivações mais diversas, pessoas têm-se reunido para repensar e rediscutir o País e, com freqüência, passar à ação.
Assim, em algum momento, que não é possível prognosticar, haverá condições de formar-se uma "massa crítica" de cidadania capaz de influenciar a condução da política racional no esperado rumo do Bem Comum. Embora seja um processo lento, é o único que pode proporcionar resultados concretos para uma "reinvenção" positiva desse sofrido Brasil.
Para tanto, nenhum esforço é insignificante e ninguém deve se isentar dele. Em tais momentos, sempre vale recordar a máxima de Edmundo Burke: o maior erro foi cometido por aquele que nada fez, por achar que apenas poderia fazer muito pouco.



Editado por Giulio Sanmartini   às   7/20/2006 09:27:00 AM      |