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Entrevista com Eduardo Mahon
Por Adriana Vandoni

Minha conversa da semana foi com o advogado Eduardo Mahon. Ele explicou a Ação Popular que apresentou na última segunda-feira (28), contra o Protocolo assinado em 2003 entre o governo do estado e o Tribunal de Justiça. Protocolo este que causou estarrecimento no país e em especial no mundo jurídico.
Leia abaixo:

O que o motivou a apresentar essa ação?
Eduardo Mahon: A inatividade das demais instituições, assim como o fiz com o caso dos promotores de justiça que assumiram o cargo de secretário de Estado. Não suporto as furtivas - "vamos investigar" ou "estamos estudando". A averiguação deve ser direta. De minha parte, vejo na Constituição de 1988 um instrumento hábil para que qualquer cidadão-eleitor realizar ou complementar a fiscalização pública, mormente onde o espaço de consenso é muito grande e os interesses são, por vezes, muito intrincados. Assim, um cidadão comum pode manejar o remédio jurídico para desfazer contratos públicos, reconstituir o erário, enfim, uma enorme gama de possibilidades e, ressalte-se, sempre em benefício da sociedade, nunca em prol de um cliente, de um amigo ou de si próprio.

Qual o trâmite legal disso?
Eduardo Mahon: Sumaríssimo. Os Requeridos apresentam as provas, eu fico satisfeito com o que verei, o Ministério Público se manifesta e, caso não haja qualquer outra prova a ser produzida, o juiz deve manifestar-se com a mesma presteza do mandado de segurança.

Quem vai julgar ou intimar o presidente do TJ e o Governador do estado?
Eduardo Mahon: É o Judiciário de 1ª Instância o responsável por conhecer de processos dessa natureza, ainda que seja contra autoridades de calibre maior. Veremos o grau de independência institucional que, certamente, pretendo encontrar. Aliás, eu sou apenas um substituto da própria sociedade. Acho interessante como todos falam e poucos fazem. Neste caso, a decisão será paradigmática e levará Mato Grosso ao aprimoramento institucional da relação de poderes. Precisamos crescer, neste sentido. E vamos crescer. Somos um Estado, não somos uma empresa.

O que pretende a Ação?
Eduardo Mahon: Reconstituir o Erário Mato-grossense, caso haja a comprovação do dano sofrido com o protocolo firmado entre o Governador e o TJMT, além de anular todos os processos em que atuou o Judiciário de 1a e 2a Instâncias, sob a sombra da contrapartida de 20%, firmada no tal convênio.

Em todo Protocolo analisado, qual irregularidade mais o chamou atenção?
Eduardo Mahon: É simples. Compreendo que o Judiciário precisa mesmo de uma espécie de compensação pelo enorme trabalho que desempenha em processos em que não se recolhe custas ou taxas. Mas, por qualquer ótica a ser observada, o convênio é irregular do ponto de vista administrativo, ilegal do ponto de vista jurídico e imoral, do ponto de vista social. Não é preciso ser um gênio para pressentir que o Poder que tem interesse direto no resultado de uma determinada ação não pode contribuir de qualquer forma para o convencimento do julgador. Penso eu que nenhum juiz ficou suspeito por isso e sim o próprio Poder Judiciário, institucionalmente, o que é muito pior. Cancelando o acordo, o Desembargador Lessa deu recados claríssimos para os poderes. Entenda quem souber ler nas entrelinhas da inteligência, a ousadia da atual administração. O TJ nunca mais será o mesmo e, em dois anos, vamos ter um outro quadro completamente diferente, com os ensinamentos dos antigos e com a vontade de mudança dos mais novos.

Quais os possíveis resultados dessa Ação?
Eduardo Mahon: A nulidade de todos os processos, a imposição de multas aos gestores públicas, a devolução de todos os recursos devidamente corrigidos e, finalmente, a apuração de crime de responsabilidade dos envolvidos. Quero ver como a Assembléia vai se manifestar, mais uma vez silenciosa ou firme em suas próprias prerrogativas constitucionais, assim como o Tribunal de Contas que não devia ter conhecimento do mecanismo pelo qual essa arrecadação complementar se dava. Isso, além do Ministério Público que deve parar de "estudar" e tomar conhecimento da ação e nela intervir como fiscal da lei que é. Aliás, aqui vai um serviço de utilidade pública: qualquer cidadão ou empresa que tenham se visto prejudicados com os julgamentos, podem se habilitar na ação que tramita na Vara Especializada. Basta peticionar. Estou certo que vai chover assistentes nesse processo. Estou certo de que o próprio TJ vai reconhecer a irregularidade, assim como o Ministério Público.
Em certo ponto do documento, o senhor diz que “não se trata de renúncia fiscal propriamente, e sim uma clara dação”. O senhor pode explicar melhor isso?
Eduardo Mahon: Renúncia se dá consoante a lei ou ato unilateral, previamente autorizado. Aqui, no caso dos 20%, a origem era de processos judiciais, ou seja, tratava-se do patrimônio estadual de Mato Grosso que, após arrecadado, ninguém jamais poderia com ele bulir, sem a expressa autorização da Assembléia Legislativa. Isso, ainda que fosse com as melhores intenções e, creia, comungo do ideal de um Judiciário mais forte e sem o pires na mão. Contudo, dessa forma, tratou-se simplesmente de repasse por uma contrapartida, como diz o convênio. E essa contrapartida é possível em processos onde o próprio poder beneficiário é que julga o caso, mormente em valores relevantes? Penso que não. Vejamos a opinião pública, a classe empresarial e o próprio Judiciário. Não há escapatória. Ora, se o próprio Desembargador Lessa, Presidente do TJMT, anulou o convênio por não ver nele legalidade, como ficará o recurso arrecadado? Não se pode pensar em meia-nulidade. Ou é nulo e se devolve o dinheiro ou não é nulo. Seria de se estranhar anular um convênio pela ilegalidade de "preferências" inexistentes na legislação e ficar com os 20% que foram repassados.

Na Ação o senhor pede que o montante repassado ao TJ pelo governo seja devolvido aos cofres do estado. Qual a possibilidade de que isso venha a acontecer?
Eduardo Mahon: Depende apenas do Ministério Público acompanhar com zelo, na condição de fiscal da lei e do próprio Judiciário, cortando na própria carne. Eu sei que dói, mas é preciso. Assim como admirei Lessa e Perri, rompendo com este estado de coisas, assim como admirei as declarações de Faiad, nosso Presidente da OAB e as de Turim, membro do MP responsável pelo patrimônio público, certamente passada a tempestade, vou admirar ainda mais o nosso Judiciário que é dos mais competentes do país. Tenho a certeza disso. Eu sempre faço referência ao dinamismo desse Poder Estadual.

Mas como avalia o dano moral, de credibilidade ao Judiciário de MT e como reverter essa imagem?
Eduardo Mahon: Penso que o Executivo faça o que possa para angariar apoio e blindar-se a si próprio. Os homens que detém o poder querem cercar-se de poder adicional para não serem atingidos. É muito natural propostas desse jaez. Anormal é aceitá-las. O Judiciário precisava de recursos e sucumbiu infelizmente diante do canto da sereia do repasse fácil, já que os processos de execução são mesmo inadiáveis para o recolhimento tributário. Vamos investigar e verificar o que se deu. Mas garanto que não é assim que se alcança independência e a suficiência orçamentária. Senão, daqui a pouco, vou pedir para que um cliente meu dê 20% para que a causa seja julgada com muita celeridade, eu seja recebido com prioridade e tudo o mais se dê com um dinamismo não previsto em lei. Mas, de outro lado, não é por isso que devemos desacreditar em que é responsável por nos julgar, quem detém a última palavra e, tanto é assim, que acredito que o próprio Judiciário vai recompor o erro do Judiciário. É que eles têm o direito de errar por último e de retificar o próprio erro. E assim, segue mais forte a nossa democracia. Não é jogando pedras que fortalecemos as instituições e sim com ações práticas. Menos papo e mais ação, sociedade!

O senhor tem algum cliente que se beneficiará caso sejam anulados os processos de execução fiscal durante o tempo em que o Protocolo vigorou?
Eduardo Mahon: Não. Eu não atuo nessa área.


Editado por Adriana   às   5/01/2008 01:45:00 PM      |