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O ENCOSTO DA BANCADA EVANGÉLICA
Por Villas-Bôas Corrêa em A Voz da Serra
Pelos últimos dados revistos e atualizados pelo reforço do depoimento à Justiça Federal do empresário Luiz Antônio Trevisan Vedoin – com as altas e confiáveis credenciais de um dos chefes da máfia das sanguessugas – a lista dos envolvidos com a compra de superfaturadas ambulâncias, ônibus escolares e outros equipamentos salta de 57 para 105 parlamentares, recorde absoluto no respeitável campeonato de corrupção, não apenas deste ano, mas de todos os tempos.
Como a pedra apenas começou a rolar do alto da montanha da roubalheira, na tensão da fase decisiva da campanha eleitoral, os cuidados para evitar a precipitação leviana das análises e das conclusões devem ser reforçados pela prudência. Não há, por enquanto, denunciados no banco dos réus, mas a avalanche de suspeitos de espantosas proporções, envolvendo um em cada cinco deputados federais, além do solitário senador paraibano Ney Suassuna, líder da bancada do PMDB.
O bolo só tende a crescer, não se sabe aonde vai parar. A troca clássica de acusações entre governo e oposição reparte culpas e omissões em doses diferentes. Mas é cedo para a contabilidade dos inocentes e mafiosos.
Uma curiosa e vexaminosa arrumação dos enrolados na tramóia, acomoda em três categorias os 57 ou os 105 da lista de suspeitos: 1- os que receberam propinas em suas contas bancárias; 2- os que se fizeram representar, num requinte de escrúpulos, por assessores ou parentes e; 3- os que levaram a desconfiança à ostensiva exigência do pagamento em dinheiro vivo, enviado em pacotes ou em malas para os gabinetes individuais de suas Exas. no Congresso.
O vice-presidente da CPI das sanguessugas, deputado Raul Julgmann, em declarações aos repórteres, avançou a avaliação de que mais da metade da bancada evangélica desfila no rol dos denunciados pelo empresário Luiz Vedoin. Quase toda a representação evangélica dissolve-se na massa do bolo do baixo-clero: a turma de anônimos que passa em branco pelo mandato, com escassa participação nos debates no plenário ou nas comissões, poucas ou nenhuma proposta de projeto e uma exuberante apresentação de emendas ao Orçamento.
Ora, sem preconceitos ou má vontade é pelo menos estranhável a preocupação das igrejas evangélicas em eleger bancadas numerosas para as duas Casas do Congresso, assembléias estaduais e câmaras de vereadores. Além do olho comprido nos mandatos do Executivo. A julgar pelo desempenho da safra atual e as repercussões calamitosas no conceito das seitas emporcalhadas pela lama dos escândalos, é hora de uma revisão do projeto político antes que a desmoralização repercuta nos múltiplos interesses pendurados na arrecadação de dízimos e outros empreendimentos.
Nos muitos horários das redes de TV alugados pelos evangélicos, de um tempo para cá, não sei precisar quando, uma intrigante epidemia de encostos martiriza os crentes que buscam socorro nas sessões de descarrego, com horário fixo para o alívio de milagres por atacado.
Com receio da minha confessada ignorância no ramo, procurei a exata definição de encosto na sabedoria dos dicionários. E fui iluminado com respostas de redação precisa. Ensina mestre Aurélio, entre as muitas variações de encosto, a que nos interessa de clareza transparente: “Espírito que está ao lado de um ser vivo para protegê-lo ou prejudicá-lo”.
O sábio Houaiss bate no cravo, quase com as mesmas palavras e uma significativa supressão da serventia do encosto para a proteção do possuído: “Espírito perturbado que se presume estar ao lado de alguém para prejudicar”.
Suponho que justamente preocupada com a praga de encostos que alucina a bancada evangélica, desviando-a para as veredas da corrupção das propinas com as emendas individuais ao Orçamento destinando verbas para a compra de ambulâncias pela máfia que superfatura as contas e rateia o lucro – a cúpula responsável pelas centenas de templos pretenda convocar mutirões de descarrego para as muitas tarefas de aflitiva urgência. Pela hierarquia, a começar pelos dirigentes, vítimas da comichão da praga, seguindo-se a bancada enrolada em péssimos lençóis, com risco de cassação de mandatos e, para fechar a limpeza, dos candidatos às eleições de outubro.
Um parêntesis para a reflexão que faz cócegas na goela: para que os cultos evangélicos precisam de uma numerosa bancada nas casas do Legislativo?
A Igreja Católica, não há muito tempo, permitia ou tolerava que padres se candidatassem a mandatos executivos ou legislativos. Conheci vários, de excelente desempenho parlamentar, como o padre Medeiros Neto e o deputado Arruda Câmara, pernambucano valente e que se dizia que não dispensava o punhal acomodado na bainha debaixo da batina.
Outras as modas e costumes. O Congresso que agoniza em Brasília não é local próprio para crentes a serviço da sua fé.
E como o próximo, seguindo a regra, deve ser pior do que o atual, a prudência despojada da ambição aconselha o recolhimento dos religiosos ao silêncio dos seus templos.
Antes de tudo, o dízimo e o descarrego.


Editado por Giulio Sanmartini   às   7/22/2006 05:23:00 AM      |