A explicação da senadora Ideli Salvatti (PT-SC) de que fez empréstimos bancários no total de R$ 250 mil e que vendeu dois carros não é suficiente para justificar a movimentação financeira da líder do PT entre janeiro de 2004 e setembro de 2005. A soma desses recursos com o total de rendimentos e ajudas de custo pagos pelo Senado corresponde à metade do montante que a Receita Federal detectou nas contas correntes nesse período. Foram R$ 2 milhões - R$ 1,1 milhão em 2004 e R$ 923 mil de janeiro a setembro de 2005. Os dados da movimentação bancária foram obtidos pela Receita com base na CPMF recolhida pela senadora e foram enviados no ano passado ao Ministério Público Federal (MPF) em Santa Catarina, que abriu inquérito civil contra Ideli. Atualmente, por causa do foro privilegiado da senadora, o caso está sendo investigado pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Ideli já foi convocada para explicar a movimentação. O Estado de Minas teve acesso aos valores que a senadora recebeu nesses 21 meses, a título de verbas para despesas do exercício do mandato (restaurante, combustível, aluguel de escritório etc.), além dos salários, ajuda de custo, jetons por convocação extraordinária e auxílio-moradia. Ideli embolsou no período R$ 609 mil. Somado aos empréstimos que ela diz ter feito, o montante que entrou nas contas chega a R$ 859 mil. O total que a senadora movimentou em conta e foi tributado pela CPMF (R$ 2 milhões) é ainda duas vezes superior, mesmo se arredondar os valores que declarou ter recebido para R$ 1 milhão, atribuindo uma folga de R$ 141 mil para cobrir a venda dos dois carros e eventuais outros recursos creditados, como o ressarcimento de despesas médicas pelo Senado e restituição de Imposto de Renda. Ela não informou por quanto vendeu os carros. A reportagem consultou dois auditores fiscais. Ao analisar em tese os dados, eles informaram que há indícios de sonegação fiscal ou de depósitos de dinheiro de origem suspeita que não foram declarados. Segundo eles, verificada a distorção, a Receita deve abrir o procedimento fiscal de ofício. É assim que age o Fisco com os mortais contribuintes. Para comprovar a licitude da movimentação e dos depósitos, o contribuinte é convocado a apresentar os extratos bancários. Se o contribuinte não colaborar, a Receita pode requisitar os extratos diretamente ao banco, sem necessidade da quebra do sigilo via Justiça. A Lei 105 de 2001 permite o acesso da Receita aos dados, sem autorização judicial. Nesse caso, o contribuinte é intimado novamente a explicar a origem dos depósitos. Se ele se recusar novamente, o fiscal lavrará o auto de infração cobrando o imposto devido com multa de até 150% se considerar que houve fraude, mais juros pela taxa Selic. E enviará representação para fins penais ao MPF para processar o contribuinte com base na Lei 8.137/90, dos crimes contra ordem tributária, se cabível. Como o caso da senadora já está na PGR, o procurador-geral Antônio Fernando de Souza tem a prerrogativa de requisitar o procedimento fiscal à Receita, com verificação dos extratos bancários com base na Lei 104. Conforme informações obtidas pela reportagem, no momento em que enviou os dados da movimentação financeira da senadora ao Ministério Público em Santa Catarina no ano passado, a obrigação da Delegacia Regional da Receita era de abrir de imediato a ação fiscal, sob risco de prevaricação. A senadora tem dito que não foi questionada pelo Fisco a respeito até hoje. SEM COMPROVAÇÃO Desde terça-feira, quando o Estado de Minas divulgou o relatório da Receita apontando a movimentação milionária, Ideli Salvatti já xingou, desqualificou a reportagem, atacou o procurador da República Celso Três que a investigou e deixou claro que o mais importante para ela é saber quem vazou seu sigilo. Só não apresentou comprovação e detalhes da movimentação. Em setembro do ano passado, ela recebeu a cópia do inquérito civil instaurado por Celso Três para apurar ilegalidade em propaganda pessoal que ela fez em Florianópolis com base em obras públicas por meio de quase 400 outdoors. Segundo o procurador, Ideli não tinha recursos para bancar a propaganda pela qual sustenta ter pago R$ 162 mil. Ideli revelou ainda que tomou conhecimento novamente da documentação no início deste ano, quando foi encaminhada à CPI dos Correios, mencionando que movimentou R$ 2 milhões em 21 meses. Indagada na segunda-feira passada, respondeu que essa movimentação se devia a "alguns empréstimos", mas disse não se lembrar dos valores. Terça-feira, em plenário, falou em empréstimos de R$ 250 mil em três bancos - Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Banco do Estado de Santa Catarina (Besc), mas também não apresentou comprovações. Quarta-feira, a reportagem solicitou à senadora a razão de não ter se explicado para o MP em Santa Catarina. Pediu também o total de rendimentos e verbas que ela recebeu do Senado bem como os dados dos empréstimos para o jornal publicar com destaque suas explicações e até fazer eventual correção, se houvesse, e ainda informações sobre o apartamento avaliado atualmente em R$ 280 mil que ela teria ajudado o filho a comprar no ano passado. Ela prometeu responder as questões por escrito, mas só mandou a cópia da resposta que encaminhou ao procurador Celso Três, dizendo que não se manifestaria.
Fonte: Estado de Minas
Editado por Adriana às 6/27/2006 01:33:00 AM |
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