por Ralph J. Hofmann Durante centenas de anos os judeus da Europa viveram em áreas separadas das cidades, às vezes áreas muradas. Eram isolados do resto da população por forças externas, pela força. Estas áreas foram chamadas de “guetos”. Posteriormente surgiram outros guetos formados pela imigração econômica. Irlandeses, alemães, italianos, judeus, japoneses, russos e chineses, criaram seus guetos ao imigrarem para países como os Estados Unidos, Brasil e Argentina, inicialmente devido a fatores como idiomas e costumes diferentes, por algum tempo devido a manterem os grupos familiares dentro das estruturas dos países de origem e até mesmo das vilas e lugarejos dos países de origem. O progresso levou a segunda e terceira geração desses países a trabalharem fora das comunidades, o acesso a oportunidades em lugares distantes e o espaço restrito nos locais de origem levaram os jovens a novos horizontes. Redundaram em casamentos multiétnicos, famílias espalhadas pelos muitos estados do país. As velhas vizinhanças se desmancharam, passaram a abrigar essencialmente os mais velhos. Novos migrantes passaram a ocupar os guetos. À medida que as diferentes etnias galgavam sucesso econômico, mesmo que discreto, a maioria procurava novos horizontes, lugares mais agradáveis. Isso é generalizado. Os italianos de São Paulo não são mais essencialmente do Bexiga. No Bexiga existem pessoas de todas as comunidades. Os residentes da favela ao lado da minha casa em Caxias do Sul hoje moram por toda a cidade, aliás já encontrei alguns da minha geração em Brasília e no interior de São Paulo. Na favela propriamente dita estão apenas alguns dos pais dos meus contemporâneos. Muitos melhoraram suas casas mas a maioria dos casebres passou a uma nova corrente migratória. Há ainda guetos gerados pela pobreza abjeta. São as origens dos morros do Rio de Janeiro. São os lugares mais desvalorizados das cidades. Em parte são guetos formados pelo desprezo racial como eram os guetos europeus onde viviam os judeus, mas sua manutenção por muito tempo espelha a dificuldade de vencer não apenas os problemas raciais mas também os de educação e pobreza. Esses problemas causam um atraso no progresso dos habitantes, mas é uma questão de mais gerações, não uma questão de impossibilidade. Contudo hoje vemos um processo diferente neste país. Os acampamentos de sem terra. O MST, Vias Campesinas, e órgãos do governo contribuem para a criação de um gueto e para sua manutenção durante um período de tempo sem que se perceba um horizonte para seu fim. Em todos os guetos de que tenho notícia as pessoas ao procurarem trabalho ou emprego percorriam as cidades e os campos. Interagiam com outras pessoas, criavam objetivos, viam outros progredir, aprendiam pequenos ofícios, faziam biscates. Essencialmente seguiam sendo homens e mulheres independentes, com confiança em seus próprios braços e pernas. A situação dos acampamentos do MST em que as pessoas ficam à margem da sociedade, sem falta de comida e agasalho, pois o governo supre tudo para que se dediquem em tempo integral a sitiar as fazendas vizinhas cria uma coletividade de eremitas. Os eremitas, de forma geral eram homens que ficavam isolados das sociedades. Em alguns casos eram vistos como santos homens e as populações lhes traziam comida. Não conversavam. Simplesmente estavam ali. Não interagiam com ninguém, ao contrário dos monges budistas que percorrem diferentes regiões recebendo comida e orando com as populações. Os acampamentos não possuem diversidade de informação, não estão expostos a opiniões que não sejam as dos líderes das comunidades. São um limbo em que as pessoas esperam ser admitidos ao paraíso dos assentamentos. Ao receberem seus quinhões de terra não saberão mais raciocinar por si. Não saberão equilibrar-se sobre suas próprias pernas. Suas mentes, livres das angústias de suprir as necessidades básicas aos seus estarão embotadas. Além disto, segundo se percebe, também estão sujeitos às vontades das lideranças e dos mais fortes, donde sua vida lembra de certa forma as vidas dos escravos nas senzalas, seu direito de ir e vir estando limitado pelo medo (lembram o muro de Berlim) de que um ou outro venha ter numa cidade e conte a todos nós como vivem e quem são os Kapos que lhes disciplinam. Apesar das ajudas de custo, dos equipamentos desviados para pressionar fazendeiros, apesar de estarem de certa forma explorando a sociedade, estão convictos de que quem os explora é a população em geral. Estão exatamente na situação de milhares de jovens na década de setenta que eram atraídos por seitas e, se recuperados pelos pais por serem menores levavam anos para serem desprogramados. Em grande parte, pelo regozijo que podemos ver nos vídeos de ataques, não possuem mais nenhum discernimento quanto à cidadania, e pela crueldade com que tem tratado gado e gente que esteja em seu caminho passa a lhes escassear até mesmo um senso de moral. Considerem, a maioria dos casos de psicopatas teve uma figura de autoridade cruel e monolítica no seu passado. Vamos pagar caro por esses acampamentos durante várias gerações.
Ralph Hofmann
Editado por Adriana às 6/23/2006 08:54:00 PM |
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