Por João Luiz Mauad em Mídia sem Máscara Um casal de amigos - perfeitos representantes da classe média alta do Rio de Janeiro, moradores de frente para o mar de São Conrado, num dos pontos mais nobres da orla marítima da Zona Sul carioca - viajou recentemente a São Paulo, para um compromisso social noturno. Foram de carro até o aeroporto Tom Jobim, estacionaram o seu veículo “do ano” e tomaram um avião. Após o rega-bofe paulistano, passaram a noite num hotel, retornando ao Rio na manhã seguinte. Detalhe: a pernoite do automóvel, num dos estacionamentos mais caros da cidade, não lhes custou um só centavo, pois, à saída, bastou que a minha amiga sacasse a sua “carteirinha de idoso” e a apresentasse ao caixa. Sim, senhores. Existe uma lei aqui nestas paragens cariocas que concede aos maiores de 65 anos, independentemente da renda ou de qualquer outro critério seletivo, a gratuidade nos estacionamentos da cidade. Não importa se o sujeito tem um Chevete 75 ou um Mercedes Benz do ano, seu privilégio está garantido. Vocês sabem, há muito idoso por aí que não pode tirar o carro da garagem por falta de dinheiro para pagar o estacionamento. Não duvido nada que, daqui a pouco, lhes será franqueada também a aquisição de gasolina, o óleo, os pneus e tudo mais afinal, fazer caridade com o bolso alheio é um dos esportes nacionais mais praticados em Pindorama.
Ouvindo essa estória absurda, lembrei-me imediatamente da famosa frase cunhada por Milton Friedman, que deu título a este texto, bem como de um artigo de Nemerson Lavoura [*]. Deixo-vos então na boa companhia do Lavoura, cujo texto irá mostrar algo que, apesar de um tanto óbvio, muita gente ainda não compreende e, por isso, continua aplaudindo iniciativas demagógicas de concessão de privilégios: alguém sempre pagará a conta e este alguém pode ser você. *** “NEAG, P! TANSTAAFL é o acrônimo para o adágio "There Ain't No Such Thing As A Free Lunch", que traduzido para o português deu em "Não existe almoço grátis". Sim, esta frase ficou tão famosa que nossos amigos anglo-saxônicos resolveram criar uma "sigla" para diminuir o trabalho de repeti-la a toda hora. E este conceito ficou tão batido por lá, que naquelas terras não há mais muita gente que ainda acredite em almoço grátis. Há quem creia em fenômenos para-normais, discos voadores, duendes, etc. - mas "free lunch", quase todos sabem que não existe. Aqui no Brasil, ao contrário, a crença no "almoço grátis" é generalizada. Pouca gente por aqui parece ter alcançado discernimento suficiente para saber que nada é de graça, tudo tem um preço, mesmo que não seja você que o pague. Isto é mais verdade ainda quando se refere ao Estado, que o brasileiro enxerga como um maná, uma fonte eterna de recursos ilimitados nos quais todos podem e devem meter a mão - mas também vale para as empresas privadas. É por isso que existe o acrônimo em inglês, mas não em português. Pois eu vou criá-lo agora: NEAG - Não Existe Almoço Grátis. Mas se você for usar a frase em uma discussão com um desses debilóides de esquerda, prefira o NEAG, P! Ou seja: Não Existe Almoço Grátis, Porra! Esta mania bem brasileira da "boca-livre" salta aos olhos na matéria da Folha de 05 de março de 2006 sobre a indústria de carteiras de estudante montada pela UNE. Segundo a reportagem, a União Nacional dos Estudantes (estudantes?!), por meio de uma parceria com a Rádio Jovem Pan, está vendendo as carteirinhas até para quem não é estudante. Ano passado foram vendidas 150.000 carteiras. Este ano, projeta-se a venda de mais 300.000. O lucro estimado para este ano (somente com essa parceria, que não é a única forma de vender as tais carteiras) é de 9 milhões de reais. E por que há tanta gente - entre estudantes e não estudantes - interessada em comprar o documento expedido pela UNE? A resposta é óbvia. Quem o possui pode pagar meia entrada nos cinemas, teatros e shows. E aí, está começando a sentir o cheiro do "almoço grátis"? Para facilitar, vou citar um trecho da reportagem da Folha: "Nos cinemas de três shopping centers de São Paulo, na última sexta, os bilheteiros informavam que de 50% a 80% dos ingressos são vendidos com meia entrada. Segundo exibidores de cinema, o preço cheio do ingresso poderia ser reduzido em até 30% se a meia entrada fosse mais criteriosa". É claro, lógico, cristalino. Os malandros que têm a carteira da UNE pagam meia e nós, que não a temos, pagamos o nosso ingresso e a metade que eles não pagaram. NEAG. Eles não pagam, nós pagamos por eles. E pagamos caro. Oitenta por cento de ingressos vendidos com meia entrada, em plena sexta-feira?! É óbvio que os 20% restantes vão ter de pagar a conta. Como são apenas 20%, vão pagar caro. Se a meia entrada mais "criteriosa" reduziria o preço do ingresso em 30%, sua extinção diminuiria seu valor a menos da metade. Quem sabe assim o trabalhador pobre não poderia passar a ir ao cinema? O pior é que muita gente não enxerga esta relação entre preço do ingresso caro e gratuidades, e acaba reclamando apenas da ganância dos donos de cinema. Como se além do mais eles não tivessem de pagar impostos, etc. Infelizmente, este "fenômeno" não é restrito à meia entrada nos cinemas. Existe uma linha de ônibus que passa perto da minha casa, e que é muito utilizada por idosos e estudantes de escolas públicas. Em certos horários, os ônibus trafegam completamente lotados. Sem medo de errar, eu calculo que menos de 15% dos passageiros paguem a passagem nestes momentos de pico. São quase todos estudantes e maiores de 65 anos, que têm o "direito" de viajar de graça. Detalhe: este ônibus trafega pela zona sul carioca. Com certeza, 100% dos idosos e 99% dos estudantes de escolas públicas que utilizam esta linha poderiam perfeitamente pagar suas passagens. Como não pagam, quem paga por eles sou eu. Ah, e os trabalhadores também pagam. E nós ainda temos que viajar em pé. NEAG. Quão mais baratas poderiam ser as passagens se não houvesse esse festival de gratuidades? Mas as pessoas só reclamam de ter de ficar em pé”.
Editado por Giulio Sanmartini às 8/14/2006 04:42:00 AM |
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