Entrevistas
Arthur Virgílio
Gerson Camata
Júlio Campos
Roberto Romano - 1ª parte
Roberto Romano - 2ª parte
Eluise Dorileo Guedes
Eduardo Mahon
p&p recomenda
Textos recentes
Arquivo p&p
  
A MILIONÁRIAS CRATERAS DE NOSSAS ESTRADAS
Por Joceline Gomes e Hugo Marques em Isto É
A PF faz perícia nas rodovias e descobre que metade do dinheiro pago pelo governo é desviado
Há uma novidade relevante sob o asfalto das rodovias brasileiras. Neste momento, 40 peritos do Instituto Nacional de Criminalística (INC), da Polícia Federal, fazem prospecções em estradas de cinco Estados, colhendo amostras de piche e pedras, para descobrir qual a razão de tantos buracos. Já foram produzidos 20 laudos e, desses, quatro foram anexados a inquéritos policiais – aos quais ISTOÉ teve acesso com exclusividade. A constatação é que os buracos financeiros são maiores que as crateras encontradas no asfalto. Os peritos concluíram que, em média, 50% do dinheiro de cada uma das 20 obras, sem exceção, foi desviado para bolsos privados. As construtoras aplicam materiais de terceira qualidade, registram desmatamentos em local sem árvores e diminuem a espessura do asfalto. A espessura mínima de 2,5 centímetros chega a cair para um centímetro. Os quatro laudos anexados a inquéritos, todos relativos a trechos de asfalto no Tocantins, comprovam desvio total de R$ 230 milhões. “Estes laudos constituem um avanço importante na identificação da corrupção”, comemora Lucas da Rocha Furtado, procurador-chefe do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União. “É um marco no combate ao crime organizado.”
O INC já faz laudos de qualidade de asfalto no Tocantins, Acre, Piauí, Roraima e Rio Grande do Sul. Os laudos dos peritos começam a ser anexados a inquéritos que apuram superfaturamento, desvios, fraude e outros tipos de crimes. Há milhares de trechos para serem analisados em todo o País, em obras federais ou estaduais que levam dinheiro da União. O caso mais acintoso, até o momento, é o da construção de 89 quilômetros de rodovia entre os municípios de Wanderlândia e Xambioá, no Tocantins. São dois contratos firmados entre a Secretaria dos Transportes do Estado e as empreiteiras Egesa Empreendimentos, de Minas Gerais, e Via Engenharia, de Brasília. O laudo aponta irregularidades em obras de desmatamento e no movimento de terra. Segundo os peritos, teriam sido desviados R$ 85 milhões, em valores atualizados. Significa um desvio de R$ 1 milhão por quilômetro. “Não tem superfaturamento”, garante Eduardo Martins, diretor comercial da Egesa. “Hoje, fazer obra não está fácil.” Em sua defesa, Martins apresenta relatório da Secretaria de Controle Externo do TCU. No despacho, o auditor do Tribunal atesta que a obra foi realizada “a contento”. A direção da Via, por sua vez, informa que vai se inteirar do processo antes de se pronunciar.
Nessa primeira amostragem da PF, a Egesa também foi apanhada no contrato da construção de trecho de 68,5 quilômetros entre Aguiarnópolis e Luzinópolis, no Tocantins. O prejuízo corrigido seria de R$ 66,9 milhões. Também para esse caso, a Egesa utiliza relatórios do Tribunal de Contas em sua defesa. Mas é exatamente essa a novidade. Até agora, todas as obras públicas vinham passando por auditorias do TCU, por amostragem. Os auditores fazem uma análise dos documentos da licitação e visitam algumas obras para checar se elas realmente existem. Geralmente as estradas estão lá. O que a PF começou a fazer é analisar com profundidade a qualidade da obra – e seu custo real. Ou seja, saber se a camada de asfalto empregado, a quantidade de brita e compostos químicos confere com os valores contratados no papel. É uma mudança na realidade brasileira. “Hoje, estão só passando farofa por cima de um asfalto já desgastado e jogando o dinheiro público fora”, acusa o presidente da Associação Brasileira de Transporte de Cargas, Nilton Gibson. “Com a primeira chuva, tudo vira pó.”
No momento, o governo federal realiza obras de recapeamento no valor de R$ 440 milhões dentro da Operação Tapa-Buracos, anunciada pelo presidente Lula em janeiro último. O TCU checou as licitações e constatou irregularidades que justificam a paralisação de 47,5% dessas obras. Elas agora devem entrar na longa fila das perícias da PF. O problema é que perícia custa muito dinheiro. A PF gasta em média R$ 15 mil por cada laudo de análise de asfalto. Sem alguns equipamentos, os peritos recorrem aos laboratórios das universidades e institutos. O INC em Brasília tem excelentes equipamentos para análise de drogas e substâncias químicas, por exemplo, mas a área de análise de qualidade de asfalto é novidade técnica. Com menos de R$ 100 mil, dizem os peritos, será possível comprar as máquinas para montar um mini-laboratório de análise de asfalto. “O Congresso também pode ajudar criando leis mais rígidas para punir superfaturamento”, diz o analista político Márcio Coimbra. “A dificuldade é que muitos políticos tiram o dinheiro das campanhas justamente dessas obras.”


Editado por Giulio Sanmartini   às   8/13/2006 07:22:00 AM      |