Por Augusto Nunes no Jornal do Brasil O delegado Paulo Lacerda lembrou na quarta-feira que "jornalistas não estão acima da lei". Nem policiais federais, advertem milhões de brasileiros formados na crença de que todos os cidadãos se submetem igualmente às normas legais fixadas pela Constituição e pelos códigos em vigor. Crachá de repórter não é salvo-conduto para delinqüências. Blusão negro e tresoitão na cintura não promovem nenhum policial a xerife de faroeste americano. A lei desconhece o ofício. O doutor Lacerda ficaria melhor no retrato se tivesse recitado a frase durante o julgamento do jornalista Pimenta Neves, assassino confesso da ex-namorada (e também jornalista) Sandra Gomide. Nessa hipótese, engrossaria o universo dos perplexos com a impunidade de quem soube usar os trunfos da imprensa para fazer amigos que mais tarde o ajudariam a livrar-se da cadeia. O chefão da Polícia Federal preferiu guardar a frase para justificar outra afronta à liberdade de imprensa registradas neste pressago começo de primavera.
Em tese, três jornalistas da revista Veja- Julia Duailibi, Camila Pereira e Marcelo Carneiro - deveriam prestar esclarecimentos à Polícia Federal sobre uma reportagem inspirada em manobras protelatórias ocorridas nas investigações sobre o Dossiê Vedoin. Na prática, consumou-se um espetáculo de truculência, estrelado pelo delegado Moysés Pereira. Valendo-se da metodologia da boçalidade, o sherloque procurou reduzir as testemunhas a réus e, poucas escalas além, a criminosos. Começou por criticar asperamente a reportagem. Em meio à discurseira sobre a "parcialidade" do que fora publicado, enviou recados iracundos aos editores da publicação. Não permitiu a participação da advogada dos jornalistas. Terminada a sessão intimidatória, recusou-se a entregar aos depoentes a transcrição oficial do que haviam declarado. "Jornalistas não estão acima da lei", disse então Paulo Lacerda. Nem abaixo, deveriam ter replicado os brasileiros democratas, atormentados desde 30 de outubro pela retomada da ofensiva por tropas liberticidas. Na primeira aparição pública de Lula depois da vitória, só participou da entrevista em Brasília quem sobreviveu ao processo de triagem forjado por militantes do PT. Dezenas desistiram na fase dos insultos. Outros tantos sucumbiram à etapa da agressão física. O presidente reeleito não aprovou o resultado da experiência. Nada contra a metodologia em si. Lula apenas acha que episódios do gênero "podem contribuir para a vitimização da imprensa". Craque em bancar a vítima, o presidente sabe que isso é perigoso. Brasileiro é gente boa. Vive com pena de quem está apanhando. Presidente interino do PT, Marco Aurélio Garcia primeiro soprou ("Não concordo com violências"). Depois, mordeu com gana: "A imprensa precisa de uma auto-reflexão sobre como se comportou durante a eleição"). Sobre a violência infligida aos repórteres da Vejapelo delegado Moysés, nenhuma palavra. Garcia não fala sobre a revista. Nem com. Ao assumir o comando do PT, Ricardo Berzoini decidiu que o partido esperaria a eleição passar para tratar do caso dos mensaleiros. O companheiro foi substituído - quem diria?- por um pajé com quem não ousaram sonhar sequer os piores da tribo. Garcia não se contenta em absolver liminarmente os pecadores. Exige que a imprensa peça desculpas aos mensaleiros pelo sofrimento que injustamente lhes causou. O professor que aproveite seus minutos de fama. Governos passam, a imprensa fica. Os bandidos que reivindicam pedidos de desculpas um dia haverão de ouvir a voz de prisão.
Editado por Giulio Sanmartini às 11/07/2006 12:53:00 AM |
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