Guilherme Fiuza, em NoMinimo- Deu Lula de novo, e fim de papo. A investigação do dossiê não tem mais a menor importância. Claro, é preciso apurar e punir etc etc. Mas isso não mexe mais com o futuro do Brasil, e quem quiser questionar o mandato do presidente reeleito é que tem que ser preso por conspiração.
O teatro eleitoral acabou. Agora começa outro (bem mais chato) no mundinho cinzento da política. Daqui para frente, a palavra que você vai ler/ouvir em dez em cada dez notícias sobre os novos tempos é “crescimento”. Duvide dela. É um mantra que parece abarcar toda a pauta de demandas ao novo governo. Na prática, não quer dizer nada.
A tentativa da oposição de insistir no dossiê para atingir Lula após a eleição liquidada é lamentável. Os meninos aloprados são todos ligados ao presidente. Mas não se achará impressão digital dele. O foro para questioná-lo não era o judicial. Era o político.
O foro político era a eleição. Lula apresentou-se para disputá-la com o escândalo do mensalão nas costas. Todas as principais figuras incriminadas pelo procurador geral na famosa quadrilha dos 40 ladrões – José Dirceu, Delúbio Soares e Luiz Gushiken à frente – eram da cota pessoal do presidente. O mesmo se pode dizer de Lorenzetti, Bargas e companhia, os meninos do dossiê.
As peças que Lula escolheu para governar o país com ele, portanto, caíram de podres. Não seria preciso processo judicial para a opinião pública julgar a total responsabilidade do presidente pelas malfeitorias. Bastaria não votar nele.
Mas o povo votou, e votou em massa.
Recado político claro e definitivo: mensalões e dossiês? Às favas com os escrúpulos de consciência (copyright Jarbas Passarinho, 1968). Que o eleitor não reclame: daqui para frente, se quiser falar de ética, peça licença e fale baixo.
Para usar uma metáfora futebolística, em homenagem ao estilo vencedor no Planalto, agora é bola pra frente.
Enquanto a oposição faz o seu esperneio ridículo em torno do dossiê, a vida real tem que continuar. O problema é que todos os que imaginam estar conectados à vida real, recitando a palavra mágica “crescimento”, se afogam na mais abstrata ficção.
No governo e na oposição, do dia 30 de outubro de 2006 em diante, o debate político será monopolizado pelo tal do crescimento. Tucanos, pefelistas e companhia insistirão na demagogia da queda dos juros (que eles aumentaram), e petistas e companheiros defenderão – e provavelmente praticarão, porque têm a caneta – a exuberância nos gastos públicos como motor do desenvolvimento.
Os alertas feitos aqui não surtem muito efeito, mas por via das dúvidas aí vai mais um: é tudo mentira. Esse papo de crescimento não quer dizer absolutamente nada.
Tanto Lula quanto Alckmin (principalmente), quando prometiam crescimento econômico, estavam vendendo terreno na Lua. O povo pode morrer acreditando que isso se consegue com um ato de governo, daí o teatro eleitoral do tipo “o país cresceu menos no seu governo que no meu”. Dois napoleões de hospício discutindo quem perdeu Waterloo.
O crescimento de verdade, não decorrente de um ou outro surto populista desses comuns na América Latina, é conseqüência de uma multidão de fatores originados na sociedade inteira (e no mundo exterior a ela).
O noticiário costuma reduzir o tema aos chiliques de grupos como a Fiesp, em suas eternas queixas sobre juros e câmbio. São empresários querendo venda fácil e dinheiro barato. Só isso. Se crescimento e recessão dependessem de uma ou outra pirueta do Banco Central, o gráfico do PIB seria como a trajetória de uma pulga com soluço.
Eis a má notícia: a receita para o crescimento é o país melhorar. Nada mais vago. Nada mais concreto.
E o que o novo governo pode fazer por isso? Administrar direito. Infelizmente, é simples assim. Simples demais para caber num slogan de marqueteiro ou num discurso de palanque.
Uma dica: se Lululala iniciar seu segundo reinado jogando todas as fichas na tal da reforma política – a miragem mais reluzente do debate nacional –, o governo não vai fazer nada para ajudar o crescimento. Talvez atrapalhe. Se o presidente der a nova largada anunciando uma reestruturação dos impostos no país (não vale reforma tributária de mentira como a do primeiro mandato), o homem estará mais para trabalhar do que para atrapalhar.
Outra notícia desanimadora: o PIB, mesmo o verdadeiro, não é a panacéia que os políticos brasileiros candidamente cultivam. Desenvolvimento é muito mais do que isso. É evolução cultural, científica, humana e mesmo econômica em setores que sequer são captados pela medição do PIB.
Portanto, quando ouvir esse papo de crescimento, o que o brasileiro tem que fazer é duvidar. E exigir um discurso que não ofenda a sua inteligência.
PS:
A julgar pelo discurso da vitória de Lula, o Fla-Flu da eleição continua no novo governo.
O presidente reeleito falou o tempo todo para aqueles que o elegeram (agradeceu ao povo que votou acreditando que ele vai fazer ainda mais).
Caprichou no populismo dedicando sua vitória aos brasileiros que diz ter “incluído” (quando a redução da pobreza vem desde o Plano Real).
E entrou no triunfalismo ao contar vantagem contra o governo anterior e mostrar que não vai descer do palanque.
É cedo para dizer, mas tudo indica que a política brasileira continuará sendo nos próximos anos um disco arranhado.
Editado por Anônimo às 10/30/2006 08:29:00 AM |
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