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O PT "DE RAIZ" SUBMERGIU
Por Dora Kramer em O Estado de São Paulo
A bancada do PT na Câmara dos Deputados nesta eleição não perdeu muito em quantidade - baixou de 90 para 83 deputados - mas, na qualidade da representação, teve uma redução para lá de significativa.
Parlamentares chamados “de opinião”, mais afinados com a doutrina original do partido do que com o pragmatismo levado aos píncaros desde a conquista da Presidência da República, ou ficaram sem mandato, sucumbindo à má fama recém-adquirida do partido, ou tiveram uma redução acentuada nos respectivos patrimônios eleitorais.
Enquanto um deputado como Luiz Eduardo Cardozo perdeu cerca de 200 mil votos em relação à eleição passada e outros tão respeitados quanto não foram reeleitos, personagens do escândalo do mensalão que escaparam da cassação pela ação corporativa da Casa voltaram e darão o tom predominante do novo perfil da bancada.
“O eleitorado consagrou o PT presidencial”, diz o deputado Paulo Delgado, cuja derrota tira do Legislativo o mais antigo parlamentar petista, com cinco mandatos consecutivos e uma trajetória dedicada à crítica interna e à formulação de idéias.
Na visão dele, os independentes, “doutrinários”, sucumbiram ao “PT mercenário” que passou a dar as cartas explicitamente no partido depois da eleição de Lula. “Sempre fomos independentes, críticos ferozes do oposicionismo publicitário e, no governo, não fomos aproveitados nem ouvidos.”
E por que, então continuaram a sustentar politicamente o governo?
“Porque percebemos que quem se rebelasse teria de sair, não havia espaço para meio-termo e o sinal claro disso foi dado, primeiro, com a expulsão da Heloísa Helena e, depois, com a perda da luta interna pela recuperação do partido por meio da escolha de uma nova direção que levasse o partido a se reencontrar consigo.”
Tarso Genro, quando criticou a degeneração e propôs a “refundação” do PT, parecia disposto a liderar mesmo um movimento de reação, mas perdeu a briga e, para Delgado, acomodou-se junto aos “pragmáticos”, embora preservando o discurso doutrinário.
A perda de espaço desse tipo de parlamentar sem reduto nem a escora do aparelho é, na opinião de Paulo Delgado, reflexo direto da reação negativa do eleitor ao fisiologismo ao qual aderiu o PT. “O nosso eleitorado não aceita ver o deputado fazendo campanha com prefeito a tiracolo, como quem procura um emprego.”
No caso específico dele, acha que foi vítima da desqualificação interna e externa do partido. Em seu Estado, Minas Gerais, o efeito da aliança com Newton Cardoso para Delgado foi mortal. Recusou-se a subir no palanque do candidato apoiado por Lula para o Senado, criando arestas “para dentro”, mas nem por isso deixou de pagar o ônus junto ao eleitor.
“Esse grupo, tradicionalmente votado por um eleitorado mais crítico, foi avaliado pela conduta geral do partido. As pessoas diziam: ele é bom, mas é do PT.”
Caso clássico é o do senador Eduardo Suplicy, que levou um inesperado “calor” do candidato ao Senado em São Paulo pelo PFL, Guilherme Afif Domingos, numa disputa apertada - 47% para Suplicy contra 43% de Afif - em relação à expectativa inicial de uma vitória folgada do petista.
“Suplicy renovou o mandato, mas politicamente perdeu a eleição”, analisa, num resumo bem preciso das agruras enfrentadas pelos petistas não engolidos pelo lodaçal, mas marcados pelos respingos da lama.
A ironia da história, aponta Paulo Delgado, é que foi o “petismo doutrinário que fez de Lula um líder nacional” e agora foi derrotado pelo “lulismo populista”, que, na opinião dele, não devolverá o PT à sua natureza original.
A partir de fevereiro, Paulo Delgado volta à vida acadêmica. Não quer abandonar a política, apesar de um tanto deslocado “nesse Brasil de simplificações onde não importam idéias nem princípios, mas casa, comida e roupa lavada de graça”. Em dúvida sobre o rumo a seguir, tem certeza, no entanto, de que “lulismo” e “petismo” se tornaram excludentes.
“Não haverá dois vencedores: ou se reelege Lula ou se salva o PT”, diz, cansado da guerra, mas pronto para novas batalhas.


Editado por Giulio Sanmartini   às   10/15/2006 04:22:00 AM      |