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A PRIMEIRA VÍTIMA
Por Dora Kramer em O Estado de São Paulo
Lula agora acabou com a inflação, ganhou em São Paulo e combate a corrupção
Abstraindo-se os fatos e os princípios, é possível reconhecer mérito na campanha do presidente Luiz Inácio da Silva nesta etapa final. Eleitoralmente competente, a estratégia do PT de aliar o uso da máquina pública com a retomada do discurso da época em que ainda era oposição pode explicar a boa posição de Lula nas pesquisas: não só manteve como ampliou dianteira do primeiro turno.
Embora o custo do abandono de qualquer regra razoável de conduta e do menosprezo ao discernimento alheio possa vir a ser alto, criando ambiente de alto risco para um passo em falso ou um erro fatal, o medo maior nessa altura parece ser o da perda do poder. Em nome de sua manutenção, portanto, vale o perigo.
O PSDB ainda se inebriava com a própria façanha da passagem para o segundo turno e da emersão, afinal, de um Geraldo Alckmin incisivo, e o PT já saía do atordoamento inicial pelos mesmos motivos, reorganizando a tropa, unificando o discurso, caminhando ao pote com sede de anteontem na posse de um formidável arsenal de truques.
O mais poderoso deles, a retirada do arquivo dos ataques às privatizações com as quais o governo Lula conviveu quatro anos sem nenhum problema e a respeito das quais não ocorreu ao candidato fazer nenhuma crítica na primeira fase da campanha, quando imaginava ganhar sem fazer grande esforço.
Constatada a necessidade do uso de armamento mais pesado, assassinou-se a vítima primordial de qualquer guerra: a verdade.
Lula não pensa, como disse em entrevista ao jornal O Globo, que tenha sido mau negócio a venda da Vale do Rio Doce e a privatização da telefonia que reduziu de R$ 10 mil a praticamente zero o custo de uma linha fixa, popularizou os telefones celulares e, de quebra, extinguiu boa quantidade de sinecuras de uso político em detrimento da eficiência do serviço de comunicação.
Se pensa, escondeu isso do País nos últimos quatro anos.
Lula não imagina que seja mesmo o responsável pelo fim da inflação e da estabilização da moeda, como disse no horário eleitoral dos primeiros dois dias. Se imagina, convém lembrá-lo de que o Plano Real é de autoria de seu antecessor e que o PT o combateu duramente qualificando-o como 'meramente eleitoral'.
O próprio PSDB poderia se encarregar de fazer isso se não tivesse tanta resistência de enfrentar o adversário no campo do passado e se as idiossincrasias tucanas não impedissem o partido de defender a si e aos seus integrantes em eterna disputa uns com os outros.
Lula não acredita que tenha mesmo recebido um 'sim' no dia 1º de outubro dos eleitores de São Paulo e do Rio Grande do Sul, conforme informação veiculada também em seu programa eleitoral. Se acredita, deixaria de acreditar se consultasse os resultados oficiais do Tribunal Superior Eleitoral e constatar: perdeu de 54% a 36% em São Paulo e de 55% a 33% no Rio Grande do Sul.
Impossível também que em sã consciência jure sobre a Bíblia que se empenha em 'unir' a Nação e combater a corrupção, simplesmente porque não é verdade, os fatos o desmentem e a mentira, ensinam os mais velhos, tem perna curta.


Editado por Giulio Sanmartini   às   10/14/2006 12:23:00 PM      |