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PRESIDÊNCIA IMPERIAL
Por Dora Kramer em O Estado de São Paulo
Quando se fala em intenções autoritárias num possível segundo mandato do presidente Luiz Inácio da Silva, a reação mais racional - e aparentemente lógica - é considerar a hipótese, além de remota, impossível.
Raciocina-se assim: se no auge da popularidade com credibilidade Lula não conseguiu cassar o visto de permanência no País de um jornalista americano porque a sociedade reagiu, entendendo perfeitamente o significado do gesto, como teria agora, popular, mas desprovido de credibilidade, força para impor um retrocesso democrático ao País?
Ele mesmo, em seu recente anúncio de programa de governo e nos discursos feitos a bordo do convencimento pleno sobre a reeleição, nos dá a resposta de como pretende tentar enveredar pelo caminho de desequilíbrio dos Poderes, de resto já bastante desequilibrados.
No campo da fantasia performática, já não considera mais, como disse logo após tomar posse, que nem o Congresso nem o Poder Judiciário o impediriam de governar como bem lhe aprouvesse. Agora desconsidera os terráqueos e começa a enxergar os extraterrestres como os únicos desafiantes à sua altura.
Quando fala sério, porém, invoca as forças das urnas para assegurar apoio político no Congresso, apostando na desmoralização ou no enfraquecimento de todos os outros adversários. Acredita que, eleito em primeiro turno, põe nas cordas e de joelhos o contraditório.
Por enquanto, não passam de idéias e intenções não necessariamente factíveis. Em 2003, o recém-eleito presidente Lula também pretendeu governar "conversando" diretamente com a população e setores organizados por intermédio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.
Dispensou a sustentação parlamentar do PMDB - alegando não ser companhia conveniente - e acreditou que, com a maioria petista e mais a cooptação (hoje se sabe a que preço) de três partidos fisiológicos, mas menos visíveis nesse quesito, nadaria de braçada no Congresso e ainda manteria as aparências da lisura moral.
O único ponto do programa de governo que não deixa margem a dúvidas e fornece crédito à versão da tentação autoritária é o capítulo relativo à "democratização" dos meios de comunicação, baseado em estudos que contemplam o desejo de controlar e restringir, pois falam de adequação e equilíbrio da produção jornalística; evidentemente de acordo com os critérios dos proponentes.
Antes da eleição e na discussão teórica, evidentemente, ninguém assume as coisas assim com essa clareza. O esclarecimento diretamente com o fiador dessa proposta torna-se inexeqüível, pois o candidato à reeleição recusa-se aos debates e entrevistas.
Juntando-se as tentativas anteriores ao conceito que seus auxiliares mais próximos manifestam a respeito de quem na imprensa os criticam - "deformadores de opinião", na definição de Marco Aurélio Garcia - com a recusa sistemática e inédita de um chefe de Nação e reivindicante de votos a ser questionado livremente nas mesmas condições e freqüência de seus adversários, temos autorizada a suspeita do desejo de montar uma Presidência imperial o mais protegida possível dos ardores inerentes aos segundos mandatos.
E o pior é que tem gente achando normal.


Editado por Giulio Sanmartini   às   9/01/2006 12:01:00 PM      |