por Benedicto Ferri de Barros no Diário do Comércio Em seu O Fenômeno Totalitário , talvez o mais amplo e erudito estudo de filosofia política feito sobre o assunto (Editoras Itatiaia e Universidade de São Paulo,1990) Roque Spencer Maciel de Barros deixa clara a tendência de todo poder a se tornar único e absoluto, isto é, total. A razão dessa tendência pode ser sintetizada conceitualmente pelo fato de que ou o poder é maior, supremo e único, ou haverá outro poder que possa invalidar sua potência. O trabalho do prof. Roque acresce à famosa afirmação de Lord Acton de que "todo poder tende a corromper e o poder absoluto corrompe absolutamente" um complemento que completa o retrato de corpo inteiro do que seja o poder e daquilo a que tende por sua própria natureza. Esses fatos encontram exemplificação paradigmática no quadro político da atualidade brasileira. que constitui uma súmula caricata e grotesca do nosso regime republicano. Não estamos nos referindo à turbulência e instabilidade que a República instituiu na vida política do País, contrariamente ao período pacífico dos 67 anos do nosso Império. Nosso Império não regrediu para uma federação de Estados Unidos...do Brasil, como proclamou a primeira a Constituição republicana. Regrediu para o regime das capitanias hereditárias, nas quais os chefões de cada "Estado" continuam a ser os donos do poder, apenas contrastados pelo presidente da União que em um clássico de nossa história política Ernest Hambloch denomina de "sua majestade" ( Sua Majestade, o presidente do Brasil - Um estudo do Brasil Constitucional, 1889-1934 ). Nos dias correntes, atingimos ao clímax dessa realidade. A despeito da flagrante derrota de seu partido absolutamente minoritário, Lula se converteu na majestade nacional e paira como os reis das monarquias parlamentares imune, isento e irresponsável por todos os erros, desatinos e crimes que foram cometidos no seu governo. Nenhum cidadão bem informado ignora que isso foi obtido mediante o esquema do mensalão, como as CPIs deixaram incontestavelmente comprovado. Ao contrário, porém, do que sucede nas monarquias parlamentares, onde o rei reina, mas não governa, foi dado à "sua majestade" o poder de aparelhar todos os escalões do Estado com seus capo-regime, aos quais entregou o exercício da política e da administração nacional. E mais do que isso, cooptar por meios, ainda não de todo desvendados, a chefia do STF e do Senado. Para nada falar de certas alas odres da própria liderança econômica privada do País, que nele viram a oportunidade de negociar maracutaias, como a dos sanguessugas, certamente a ponta-de-um icebergue que permanece submerso. Há, porém, algo de mais espantoso e inexplicável na anarquia política institucional que caracteriza a vida do país. Lula foi o presidente que menos governou o País e menos exerceu o seu cargo. Quem menos permaneceu em Brasília e menos reuniu o inflacionado ministério que criou. De fato, ele não governou. Simplesmente porque, como declarou logo ao assumir o mandato, que o que mais queria era prorrogar sua investidura com a próxima eleição. E, se se fizesse uma conta de como gastou seu tempo, se veria aritmeticamente que mais tempo gastou na sua auto-promoção megalomaníaca e messiânica, do que no ofício de presidente. O resultado foi o desconchavo e desarmonia generalizados que se verifica entre todos os poderes complementares e embora independentes, hamônicos, como Montesquieu via ou queria que fossem. Dá para entender o racha, a desmanche e a debandada de toda a cúpula petista que traiu e deixou sozinho "sua majestade" no poder. Como se explica, então, que a despeito de todos esses fatos as pesquisas continuem a mostrar que ele será vitorioso no primeiro turno das eleições de outubro? E como falar em tendência totalitária? A explicação se acha no qualificativo que lhe aplicamos: Trata-se de um "totalitarismo macunaímico", de Macunaíma, o herói "sem nenhum caráter", como Mário de Andrade caracterizou a personagem. O diagnóstico se aplica não só à situação como à própria oposição, incolor, insípida e sem sabor, incapaz de assumir suas próprias posições. Que a despeito disso tudo o País e seu povo continuem avançando (ainda que muito abaixo de suas necessidades e possibilidades), só pode ser explicado pelo fato de que enquanto seu Estado e políticos andam numa direção, a nação e o povo andam de costas, ao contrário de tudo o que aí está, e ameaça se agravar com um eventual segundo mandato lulista.
Editado por Giulio Sanmartini às 9/01/2006 01:55:00 AM |
|