Por Dora Kramer em O Estado de São Paulo Oscila entre a franqueza absoluta e a desfaçatez total a entrevista do publicitário João Santana a Fernando Rodrigues, da Folha de S. Paulo, em que o responsável pela campanha de Lula assume sem problemas o dom de manipular impressões e emoções. Nunca antes neste país um marqueteiro reconheceu tão abertamente que a campanha eleitoral é feita de truques, não raro dissonantes da realidade. Dois trechos chamam atenção de modo especial na exposição de suas teorias sobre comunicação política. Uma dessas teses alimenta no 'imaginário popular', como ele diz, as figuras do Lula 'fortão' - o pobre que virou poderoso e assim serve como referência às expectativas de ascensão - e o Lula 'fraquinho' - acionado quando sofre ataques 'e o povo pensa que é um ato das elites para derrubá-lo'. Uma representação, utilizada à conveniência da ocasião. Outra tese é a conjugação de sentimentos nacional-estatizantes difusos na sociedade com a percepção, ainda que suposta, da existência de 'tramas obscuras'.
Este estratagema, segundo Santana, foi utilizado para 'lançar ao debate' no segundo turno das eleições a questão das privatizações do governo Fernando Henrique. 'Não quero questionar como foram feitas as privatizações, mas é fato que ficou na cabeça das pessoas como se algo obscuro tivesse ocorrido', diz ele, reconhecendo como 'fabuloso' o benefício da privatização das telecomunicações, mas reivindicando o direito de não fazer 'juízo de valor' na propaganda e admitindo que o tema não foi abordado no primeiro turno porque 'não precisou'. No segundo, diz o publicitário, 'enxerguei ali um monstro vivo que poderia ser jogado'. O problema, na ótica dele, foi do adversário, que não soube responder a contento. 'O Alckmin poderia ter mostrado objetivamente o uso de telefones, de computadores, da internet.' Quer dizer, lança-se mão de mistificações pautadas em sentimentos captados por pesquisas e a realidade dos fatos fica à mercê de quem sabe ludibriar melhor. É o tipo da conduta que não se corrige com reforma política. É questão de princípios. Ou se tem ou não se tem.
Editado por Giulio Sanmartini às 11/07/2006 08:53:00 AM |
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