Na noite de quarta-feira, o sistema de tráfego aéreo do Brasil entrou em colapso total. Na tarde daquele dia, os controladores de vôo do mais importante centro de controle do País – e que vinham fazendo greve branca havia quase duas semanas – pararam completamente as suas atividades durante duas horas e, depois disso, começaram a espaçar ainda mais as decolagens, até atingir intervalos mínimos de 30 minutos. Na manhã de quinta-feira, enquanto os ministros Waldir Pires, da Defesa, e Luiz Marinho, do Trabalho, negociavam com os controladores – tendo antes se declarado dispostos a atender às reivindicações de criar uma carreira própria para eles, autorizar reajuste salarial e contratar mais pessoal –, o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Luiz Carlos Bueno, baixou a única medida capaz de normalizar o tráfego aéreo: convocou e aquartelou no Cindacta de Brasília 149 operadores de vôo. Submetidos diretamente à disciplina militar – a maioria deles é de sargentos da Aeronáutica –, os controladores tiveram de trabalhar normalmente. No final da noite de quinta-feira já não havia nos aeroportos o caos que se registrara nos dias anteriores.
Sob controle militar, voltaram as práticas e regulamentos que vigem há anos – e que colocaram o Brasil no grupo dos países que têm tráfego aéreo mais seguro no mundo –, sem que se confirmassem as previsões catastrofistas que justificavam a operação-padrão dos controladores de vôo. Alegavam eles que, com horários apertados de trabalho, salários insuficientes e péssimas condições psicológicas, não tinham condições de garantir a segurança de vôo. Encontraram amparo para suas reivindicações – e, pior, para os métodos que escolheram para explicitá-las – num ministro da Defesa despreparado para as agruras da função, com a qual nunca teve familiaridade alguma. Seu principal erro – e nisso foi secundado pela ministra Dilma Rousseff e, depois, pelo presidente da República, que envolveu na questão o ministro do Trabalho – foi julgar que lidava com um problema trabalhista, quando o que havia era uma clássica questão de segurança nacional. Pois é assim, em todos os países do mundo, como gosta de comparar o ministro Pires, que são consideradas as greves que comprometem o tráfego aéreo.
O brigadeiro Luiz Carlos Bueno cumpriu o seu dever de comandante da Aeronáutica e de oficial-general das Forças Armadas. Atalhou, no momento certo e com meios adequados à situação, um movimento de insubordinação que já causava grandes danos à economia nacional e tinha todas as condições de se propagar a outros serviços de natureza dupla – civil e militar – das outras Forças. Em outras palavras, restabeleceu a prevalência dos princípios basilares da hierarquia e da disciplina, sem os quais as Forças Armadas se transformam em horda. No rescaldo da crise, o ministro Waldir Pires fala em “desmilitarização” do sistema de controle de tráfego aéreo com o argumento de que, em quase todos os países do mundo, esse sistema é dirigido por civis. Não consideremos, para argumentar, que o ministro da Defesa, um civil, é o responsável último por esse sistema. Ninguém se oporia, por razões filosóficas, à criação de um sistema e de uma carreira exclusivamente civis, nesse setor. Mas essa “desmilitarização” implica transformações profundas de todo o sistema de aviação civil e militar – que não podem ser feitas por palpites, nem por ideologia. E a entrevista dada pelo ministro Waldir Pires à Folha de S. Paulo de domingo mostra que ele não tem a mínima idéia do que fazer. Com intervalo de minutos, ele afirma que o novo sistema seria custeado com 2% a 3% do faturamento das empresas aéreas, sem considerar o efeito disso sobre as tarifas; depois diz que isso foi apenas um “palpite”; e, em seguida, sustenta que o financiamento do sistema é responsabilidade do Estado. E por aí vai. Essa questão é séria demais para ser tratada com palpites. A aviação civil brasileira cresceu à sombra dos investimentos feitos pela Aeronáutica para garantir a segurança de vôo e a construção de aeroportos ao lado de bases aéreas. O sistema integrado – civil e militar – adotado em 1946 gerou economias de escala que permitiram o crescimento da aviação civil. O ministro sabe quanto custaria desmontá-lo e introduzir outro em seu lugar?
Editado por Anônimo às 11/07/2006 08:24:00 AM |
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