Entrevistas
Arthur Virgílio
Gerson Camata
Júlio Campos
Roberto Romano - 1ª parte
Roberto Romano - 2ª parte
Eluise Dorileo Guedes
Eduardo Mahon
p&p recomenda
Textos recentes
Arquivo p&p
  
PROVOCAÇÃO PRIMÁRIA
Editorial em O Estado de São Paulo
Nos velhos tempos em que eram oposição, os petistas se compraziam em dizer, diante das críticas ao seu radicalismo, que o partido crescia quanto mais nele se batia. Quatro anos de governo Lula não só acabaram com essa presunção - como o eleitorado se encarregou de demonstrar domingo último - mas, principalmente, autorizam dizer que o petismo, quanto mais apronta, tanto mais reincide. A versão petista da Lei de Murphy, segundo a qual tudo que pode dar errado acaba dando errado, se aplica a 'erros' - o eufemismo oficial da agremiação para delitos - de todos os tamanhos e níveis de gravidade.
O mais recente deles, que produziu o efeito perverso de impedir a vitória que já se considerava certa no primeiro turno, foi o pacto com os chefes da máfia dos sanguessugas para lançar lama sobre a conduta do candidato tucano ao governo paulista, José Serra, quando ministro da Saúde.
O que mais impressionou na torpeza, além do seu estrepitoso fracasso, foi o fato de ter ela sido concebida como se o lulismo já não tivesse no seu passivo a enormidade do mensalão. Isso não é coisa de aloprados. É coisa de delinqüentes cuja ganância política e crença arrogante no próprio êxito os impedem de aprender com o passado.
A campanha de Lula não foi capaz de aprender nem com as primeiras decisões da Justiça Eleitoral, que cortaram tempo de sua propaganda, por ter ele aparecido no horário dos candidatos aos governos estaduais. Numa prova de que prepotência engendra alienação, o ilícito continuou a ser praticado - ao preço de novos minutos perdidos. Não espanta, por isso, o delito eleitoral cometido pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, anteontem. Em pleno exercício do cargo, para o que é pago pela coletividade, ele exibiu formidável desdém pela importância singular da função e, em entrevista no Ministério, deixou de lado as questões de que se supõe que se ocupe para vestir boné, camiseta e button de cabo eleitoral. Nessa condição, configurando um episódio inequívoco de uso da máquina, pelo qual será chamado a se explicar perante o Tribunal Superior Eleitoral, atacou a golpes de borduna o adversário Geraldo Alckmin. Tão primária como a provocação ao tucano - 'Talvez o mercado goste mais de Alckmin, mas a população gosta do Lula', arremeteu em dado momento - foi a sua tentativa posterior de descaracterizar a transgressão. Em nota, agarrou-se ao argumento de que não convocara a entrevista, como se isso descaracterizasse a violação da lei eleitoral.
Sua atitude foi, sem tirar nem pôr, mais um golpe baixo do petismo. Enquanto o primeiro companheiro faz o gênero alto nível, exumando o Lulinha, paz e amor, e apregoando a ansiedade em debater os problemas do País, como se o eleitor tivesse esquecido da imagem da cadeira vazia na Rede Globo, a companheirada faz o que mais sabe: jogar sujo. A parte que tocou a Mantega nessa empreitada consistiu em insinuar que, se eleito, Alckmin prejudicaria o Bolsa-Família. 'Uma hora vejo que ele vai fazer um ajuste fiscal rígido', a apelação começou. 'Aí eu me pergunto: ele vai cortar o quê? Os programas sociais?' O terrorismo eleitoral não ficou nisso.
Afirmou que, reeleito, Lula não reformará a Previdência, deixando subentendido que Alckmin, ele sim, fará a reforma temida por 80% do eleitorado, segundo pesquisas anteriores ao primeiro turno. Pior do que a violação da lei eleitoral foi a mistificação que encenou, dando a entender que as diretrizes econômicas de um eventual governo Alckmin serão o avesso daquelas do governo Fernando Henrique, respeitosamente obedecidas nos últimos quatro anos pelo governo Lula. Ora, está claro para os agentes econômicos que, nessa matéria, as convergências predominam.
O empresário Marcelo Odebrecht, dirigente do grupo de mesmo nome, por exemplo, foi realista. 'Ideologicamente, o PT e o PSDB estão mais próximos entre si do que do PFL', comparou. 'A questão no PT é ter alguém como o Palocci ou um ministro da linha mais desenvolvimentista como o Mantega. No PSDB, algum desenvolvimentista como o Luiz Carlos Mendonça de Barros ou alguém como o Malan.' O raciocínio omite, porém, o fator competência. Se Lula, num eventual segundo mandato, mantiver Guido Mantega na Fazenda, sobrarão problemas - seja qual for a ênfase da política econômica.


Editado por Giulio Sanmartini   às   10/05/2006 01:02:00 PM      |