Por Guilherme Fiúza em no mínimo Lá vem mais uma onda de indignação da opinião pública culta e ultrajada. Os Indiguinaldos, como o personagem de Miguel Paiva sempre pronto a um chilique cívico, estão tendo muito trabalho nessa campanha eleitoral. Agora a grita é contra o direito dado aos deputados sanguessugas de se candidatar a um novo mandato. Se o Brasil fosse deixado nas mãos da opinião pública esclarecida, isso aqui virava uma Venezuela em dois tempos. Ou uma Bolívia. Os que vivem reclamando “dos governantes” são os mesmos que não demonstram a menor atenção às instituições e aos seus ritos – ou seja, são os primeiros a esculhambar “o poder” que tanto criticam. São os que querem cassar os sanguessugas a golpes de manchete de jornal. Deputados sanguessugas são aqueles acusados de receber propina para jogar dinheiro do orçamento no golpe das ambulâncias superfaturadas. Há uma série de indícios contra eles, e seus nomes e rostos vêm sendo expostos há meses nas listas negras da imprensa. O eleitor esclarecido, que acompanha o noticiário político, já tirou sua conclusão: são todos uns vermes. É a senha para os formidáveis shows de populismo. O Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro sentiu o cheiro da oportunidade no ar, e correu para o abraço: impugnou todas as candidaturas dos sanguessugas. Não são uns parasitas? Não dão nojo? Então não podem se candidatar, e ponto final.
A opinião pública ama esse tipo de bravura, de faxina sumária. O TRE-RJ foi imediatamente para o olimpo. Como sempre, a parte chata e antipática da história foi parar nas mãos da instância superior, o Tribunal Superior Eleitoral. Aí é fartura de matéria-prima para os Indiguinaldos. O presidente do TSE, Marco Aurélio Mello, votou contra a proibição da candidatura do vilão Eurico Miranda. Evidentemente, de imediato, nas esquinas mais cultas das metrópoles brasileiras, passou a ser chamado de vendido, de primo do Collor, de mancomunado com toda essa podridão que aí está. O chato é constatar que o ministro Marco Aurélio, primo do Collor, está certo. Limpidamente certo. Por que Eurico Miranda não pode se candidatar a deputado? Porque embolsou dinheiro do Bank of América, porque desviou renda dos estádios, porque juntou um patrimônio incompatível com seus vencimentos, porque iludiu a Receita, porque fez tráfico de influência e, como se não bastasse, é vascaíno. Fora este último deslize, porém, a pergunta que se faz é: quem disse que Eurico Miranda cometeu essa penca de delitos? Os Indiguinaldos responderão: ora, as evidências disseram, os fatos deixaram claro, está na cara. Muito bem. Está na cara, mas não está no processo. O mundo inteiro sabe? Ótimo, mas a Justiça não. E se existe ainda no país algum fiapo de uma coisa chamada Estado de Direito, Eurico Miranda tem que estar livre para se candidatar ao que quiser. E os sanguessugas também. Apareceu depósito suspeito na conta do deputado? O empresário Vedoin disse que negociava com ele? O caseiro de não sei onde viu a marca de batom na cueca do parlamentar? Excelente. Joguem sua reputação no moinho do noticiário, entupam o ministério público de dados comprometedores, virem sua vida do avesso. Mas quem pode lhe cassar algum direito não é a manchete de jornal. É o processo legal. Onde está a conclusão do processo legal? O festejado juiz Lafredo Lisboa ficou famoso por jogar na cadeia, sumariamente, toda a quadrilha do propinoduto. O noticiário tinha sido claro: a máfia dos fiscais tinha 30 milhões de dólares na Suíça. E onde estão hoje Silveirinha e sua quadrilha? Estão livres como pássaros. Possivelmente são culpados, mas o juiz populista quis cassar seus direitos com base na grita dos Indiguinaldos. No final das contas, fez papel de herói, fez tipo de justiceiro e fez de tudo, menos justiça. O ministro Marco Aurélio Mello comentou sua posição em favor das candidaturas dos sanguessugas com uma frase resignada: “A sociedade não vai entender.” Vai aqui uma resposta a ele: não vai entender porque não quer, ministro.
Editado por Giulio Sanmartini às 9/08/2006 03:32:00 AM |
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