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COMO PIRANDELLO
Por Fabio Grecchi na Tribuna da Imprensa
Se o presidente Lula perder a reeleição, o bode expiatório da derrota já está escolhido: a imprensa. Boletim de campanha, enviado por correio eletrônico, tem o singelo título "Força do povo, fraqueza da mídia". Para bom entendedor, pingo é letra: como os mais importantes veículos de comunicação se recusaram a fazer papel ridículo, jogando para baixo do tapete os malfeitos da atual administração petista, foram escolhidos como inimigos. E nesta desonestidade intelectual vale até tachar a imprensa de antidemocrática e golpista.
A campanha de Lula está sendo indecente. Não faltaram veículos dispostos a dar uma colher-de-chá ao presidente, sempre de olho nas gordas verbas de publicidade. Mas não deu. Era muita lambança e evitar noticiá-las seria elevar a desinformação à enésima potência. Se por acaso Lula perder a reeleição, o terá feito por direito de conquista. Afinal, se esmerou por jogá-la fora. Se consegui-la, Deus o ajude a acalmar os ânimos, exaltados (com toda razão, registre-se) desde que mensalistas e compradores de dossiê mostraram íntimo vínculo com o Palácio do Planalto.
À certa altura do boletim, a imprensa é apresentada como "cabotina", "elitista" e "alquimista". Em relação a esta última classificação, valem duas leituras: a primeira, um trocadilho sem graça com o sobrenome do candidato tucano (Alckmin); a segunda, porque na visão distorcida da claque presidencial, os veículos se utilizam da alquimia para transformar mentiras em verdades. Dona Marilena Chauí tanto fez que seu conceito acabou sendo adotado pelos marqueteiros do presidente.
Prossegue a farsa: "Nos próximos dias, esta imprensa alquimista fará de tudo para nos derrotar. Para eles, não está em questão apenas o resultado eleitoral. Está em jogo sua hegemonia sobre a população brasileira (...) Jornais que hoje posam de democráticos e de liberais estiveram ao lado dos golpistas em 1964, apoiaram a ditadura militar, encobriram os desaparecimentos e as torturas". Mais: para o PT, parte da imprensa não aceita que "o povo seja capaz de pensar" sem depender dos "auto-proclamados formadores de opinião".
A enganação só não é mais completa porque não se sustenta. O povo a que o boletim se refere, classes C, D e E, é gente que não tem por hábito a informação diária. Compra os jornais populares, ouve as rádios religiosas e assiste aos programas mundanos de TV (até a escolha da internet como meio de divulgação de tal idéia se mostra errada, pois os computadores não chegaram às camadas mais modestas da população) para saber de fofocas envolvendo artistas, novidades no mundo do crime e calendários de pagamentos do INSS. Mas tem livre direito de escolha, inclusive se vai pela cabeça dos ditos "formadores de opinião".
Tratá-la como retardada ou imbecil é apenas mais uma faceta obscurantista de uma turma que não aceita sequer a hipótese de perder. Continuam acreditando que são os novos Moisés que conduzirão o povo à igualdade prometida. Em 2002. Pior ainda que este boletim embute uma ameaça: a de passar os próximos quatro anos atazanando Geraldo Alckmin, caso vença. Enquanto a imprensa serviu de vetor às denúncias saídas de dentro do funcionalismo, por petistas travestidos de servidores
públicos, contra o governo Fernando Henrique Cardoso, foi tratada como grande dama em defesa das liberdades civis e da lisura na vida pública. Agora que o PT e Lula se tornaram vidraça - e não fizeram coisa alguma para não ficarem ao alcance das pedras jogadas pela oposição -, os veículos são golpistas e colaboradores de ditaduras.
Claro, assim é se lhe parece.


Editado por Giulio Sanmartini   às   9/26/2006 02:58:00 AM      |