NORMA TÉCNICA
Ralph J. Hofmann – 04/06/06
Uma das coisas que chama a atenção no “affaire” dos sanguessugas é a natureza intrínseca do produto que foi superfaturado, em que foram utilizados veículos velhos, e nos quais o equipamento não era sequer de primeira linha.
Uma ambulância pode ser a diferença entre a vida e a morte. A princípio qualquer item que possa representar vida ou morte deveria estar sujeito a normas técnicas.
Qualquer exportador ou fornecedor de insumos à exportação neste país sabe disto. O Brasil é um dos países que mais aderiu às normas ISO, tanto na produção de produtos finais como de componentes e conjuntos para montagem dos mesmos. Chega a um ponto em que um fabricante doméstico de qualquer coisa busca se enquadrar nas normas ISO, procura esta certificação para garantir aos seus clientes uma qualidade internacional, mesmo que não exporte. As normas ISO em alguns casos realmente são de uma burocracia excessiva, criadas que são pelos “euroburocratas” mas tem o mérito de garantir da natureza do produto até o tratamento justo dos operários que produzem esses bens., e em outra etapa o respeito ao meio ambiente
Aqueles de nós que já exportaram produtos que envolvem segurança e risco, como ambulâncias, insumos para linhas de gás encanado, bombas e válvulas, mesas cirúrgicas e muitos outros itens, nos acostumamos a trabalhar segundo essas especificações, que não se prendem à especificação de uma concorrência em particular e sim a características de qualquer produto dessa natureza. No mercado americano somos obrigados a satisfazer normas da UL (Underwriter’s Laboratories), laboratório de certificação das seguradoras. O cliente final não consegue uma apólice de responsabilidade civil sem que o produto esteja com aprovação dessa UL ou da ULC e CSA (Canadian Standards Association) para o Canadá.
Mas aparentemente neste país basta pintar um veículo de branco, pintar uma cruz vermelha, colocar uma maca dentro e eis que temos uma ambulância. Não há sequer uma avaliação oficial estimando os valores que poderiam atingir veículos com diferentes características como dimensões, HP do motor, tipos de fechadura.
Isto num dos países em que há a maior burocracia para rastrear o que o cidadão civil faz. Em que é quase impossível registrar um carro protótipo ou um avião feito de kit experimental.
Ha alguns anos todos nós rimos gostosamente quando o Pentágono constatou que o preço de um único martelo adquirido através da burocracia dos serviços militares poderia chegar a US$ 5.000,00, considerando o tempo e esforço para aprovar a compra. Em comparação a ida de um sargento à loja de ferragens mais próxima, incluindo a gasolina do veículo e o tempo do sargento não passava de US$ 8,00. É atrás deste tipo de centralização de recursos que os sanguessugas se escondiam.
Sim, a atuação dos sanguessugas é um escândalo, mas num país em que o INMETRO já se preocupa (corretamente) até com a natureza de uma palha de aço para limpar panelas, deveria haver normas claras para uma ambulância tanto em termos de qualidade quanto de custo.
Apenas como exemplo. Esta semana, em município do Rio Grande do Sul, uma senhora que estava sendo transportada numa cadeira de rodas dentro de uma ambulância caiu da mesma porque as portas se abriram quando a ambulância arrancou. A prefeitura local simplesmente abriu inquérito, consertou a fechadura e proibiu o transporte de cadeiras de roda a não ser que fixadas naquela ambulância. Mas por que uma cadeira de rodas não era fixada com grampos antes? A fechadura é adequada para ambulâncias? Há normas sobre isto?
Se o produtor de ambulâncias tivesse de se responsabilizar, diretamente ou através de uma seguradora de boa reputação, pela natureza ou eficácia do produto, Não digo que não ocorressem novos incidentes dos sanguessugas, mas seria bem mais difícil empurrar qualquer produto para fazer caixa.
Antes de colocar em circulação este artigo consultei um amigo. A resposta dele nos situa precisamente quanto a certos vícios do ramo. Vejam abaixo:
O MERCADO DAS AMBULÂNCIAS
Ô Ralph: Já faz alguns anos que não faço ambulâncias. Pelo menos uns 8 a10 anos. No meu tempo não tinha Normas. Acontecia exatamente como descreveste: pintavam de branco, colocavam cruzes vermelhas, escreviam ambulância e colocavam qualquer quadro de tubo com uma lona e 4 rodinhas a que chamavam de maca. As únicas exigências começaram com a Inspeção Veicular, quando uma camioneta era transformada de "Standard" para ambulância. Como devia constar nos documentos do Detran que era uma ambulância, os organismos de Inspeção do Inmetro verificam se os bancos, suportes da maca, etc, estavam bem afixados no assoalho do veículo. No Brasil criaram algumas preciosidades: - Ambulância de Simples Remoção: uma Kombi ou Parati, etc, pintada de branco com uma maca dentro; - Ambulância com maca e tubo do oxigênio, montada em Kombi, Quantum, Ipanema, etc, com teto alto (alterado pelo encarroçador) - UTI Móvel que nos EUA é chamado de Ambulância, com todos os equipamentos para apoio à vida, ressuscitador, eletrocardiografo, talas infláveis, desencarcerador, radio-comunicação com o Hospital, etc... Tanto na Alemanha quanto nos EUA, são veículos normalizados, inclusive a localização de cada componente e equipamento. Todos tem a mesma localização, para não perder tempo procurando quando do atendimento. No caso dos Sanguessugas, como êles davam ao Deputado de 10 a 15%, deveriam acrescer pelo menos 40% aos preços de tabela, devido aos acréscimos de custos de impostos, etc... Se fizermos as contas pelos preços praticados e os modelos entregues, poderá se constatar que os caras da Planam não devem ter ganho tanto assim. E ainda tinham que ficar com as Receitas Estadual e Federal nos calcanhares! Ontem saiu a notícia de que no nordeste era outra empresa que tinha o esquema: uma tal de KM Empreendimentos Ltda, de Jaboatão dos Guararapes. Conheço essas peças... Me deram um golpe de R$70.000,00 em 1995/96 e não consegui nem protestar a duplicata, pois o pai de um dos diretores era Desembargador! Entendeste como funciona o esquema?
Editado por Ralph J. Hofmann às 8/05/2006 12:03:00 AM |
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