Entrevistas
Arthur Virgílio
Gerson Camata
Júlio Campos
Roberto Romano - 1ª parte
Roberto Romano - 2ª parte
Eluise Dorileo Guedes
Eduardo Mahon
p&p recomenda
Textos recentes
Arquivo p&p
  
MEU CELULAR DA MORTO!
Crônica de Adriana Vandoni

Quem consegue viver hoje sem um celular? Poucos. Os celulares passaram a fazer parte da vida das pessoas, costumo dizer que meu celular é o meu contato com o mundo, meu instrumento de trabalho e de controle dos filhos.
Logo que a primeira operadora apareceu, eu, muito novidadeira, fui comprar a minha linha. Cheguei à loja e todos eram simpáticos, sorridentes, gentis. Saí de lá como uma vitoriosa! Imponente com o meu celular MORTO na bolsa, naquela época um tijolinho. Mal podia esperar para usar.
Uns doze anos se passaram e eu cada vez mais dependente do celular. Continuo na mesma operadora, a MORTO, não propriamente por opção, mas por uma espécie burrice ou sadomasoquismo inconsciente que me faz refém da MORTO.
Para qualquer informação que o cliente precise, existe uma centena de gentis atendentes que dizem:
- Vou estar fazendo, senhor.
- Vou estar ligando, senhora.
O cliente MORTO possui todas as obrigações e nenhum direito. Lá você é apenas um caloteiro em potencial e assim é tratado. A menos, lógico, que seu comprovante de residência seja o endereço de alguma penitenciária e sua profissão seja ser membro do PCC.
Sei de tudo isso, mas continuo cliente da MORTO, como se não bastasse continuar, ainda caio nas promoções. Depois de anos com o mesmo número, fui atraída por uma irresistível propaganda MORTO. O plano contratado me dava direito a X minutos com um preço pré-estabelecido. Beleza, troquei de linha e entrei no tal plano. Mais uma vez saí da loja me sentindo o máximo!
Um belo dia meu telefone foi bloqueado. Como sou displicente, fui correndo ver se existia fatura em atraso. Não existia!
Liguei então para o “serviço de relacionamento MORTO”, o popular “vou estar atendendo”.
- Se você estiver falando do seu celular, digite 2. Se você estiver falando do celular da sua amiga, digite 4. Se você estiver falando do celular do seu vizinho, digite 6. Se você não estiver falando de celular, digite 8”.
Caramba! Mas eu não estava falando, estava apenas ouvindo. Acho que a MORTO deveria trocar a frase, o certo seria: “se você estiver escutando do...”. E por ai vai, um relacionamento extremamente humano, entende? Consegui vencer a máquina e fui atendida. Nisso já eram quase dez da noite. Recebi a esclarecedora informação:
- Senhora, seu telefone foi bloqueado para a segurança do cliente.
- Como assim? Não entendi! Que cliente? Eu?
- Senhora, seu telefone foi bloqueado para a segurança do cliente. A senhora deve estar se dirigindo a uma loja MORTO para estar recebendo maiores informações.
Fiquei preocupada, é claro, e curiosa também. Com essa moda de grampo em telefones, já estava me vendo dentro de um filme de James Bond... só podia ser isso.
No outro dia fui cedo a uma loja MORTO. Linda a loja! As moças todas sorridentes e gentis. Horas e horas depois, com a senha na mão já toda enroladinha para extravasar minha ansiedade, fui atendida e me informaram o motivo.
- Seu celular foi bloqueado para a segurança do cliente. A senhora ultrapassou o limite da sua média de consumo.
- E qual é a minha média de consumo? Como vocês encontraram a minha média se essa linha foi habilitada no dia 29/04/06 e hoje é dia 19/07/06?
- Senhora, essa média não somos nós que determinamos, é lá no sistema.
- Que sistema?
Isso é o cúmulo! O sistema da MORTO traçou o meu perfil observando meu consumo durante longos “um mês”. Em junho, quando de fato eu comecei a usar o aparelho, o consumo subiu. Daí eles bloquearam. Não é uma graça?
- O sistema, senhora, lá em cima. A senhora precisa estar fazendo um depósito identificado e depois estar passando um fax para a central de religações MORTO.
- Mas peraí. Que depósito é esse? Não estou devendo um puto centavo para a MORTO!
- A senhora pode estar esperando? Vou verificar isso.
- Minha filha, estou esperando desde as 8 da manhã para ser atendida. São 11:45, é óbevio (sic) que posso estar esperando.
Depois de vinte minutos volta a atendente:
- Senhora, realmente a senhora não tem fatura em atraso.
- Oh, eu já não tinha dito isso?
- A senhora deve estar passando um fax com o comprovante de pagamento da última fatura para o número 0800XXXXXX, que depois de 15 minutos seu aparelho voltará a funcionar.
O que fazer? Resignada, fiz certinho conforme orientação e quatro horas depois, nada do meu celular voltar. Eu continuava muda e morta.
Eram cinco da tarde e eu estava feito louca procurando alguém dentro dos atendimentos de “relacionamento” que pudesse resolver isso. Telefonei para todos os números que existem: 0800555XXX; 62-3238XXXX; 0800-600XXXX; 30511XXXX; 10XX e outros tantos. Todos diziam a mesma coisa:
- Senhora, esse serviço não pode estar sendo resolvido por aqui, é outro departamento e não posso estar transferindo a senhora pra lá.
- A senhora dever estar se dirigindo a alguma das lojas MORTO.
Puxa vida! Eu já tinha ido! Que coisa! Eu dizia isso e a mulher continuava repetindo:
- Senhora, esse serviço não pode estar sendo resolvido por aqui, é outro departamento e não posso estar transferindo a senhora pra lá.
- A senhora dever estar se dirigindo a alguma das lojas MORTO.
Isso é uma brincadeira? Não, é safadeza! Enfim, ao amanhecer do quarto dia muda, voltei à loja. Sabe o que a atendente me disse?
- A senhora precisa estar fazendo um depósito identificado com o valor da fatura que ainda não venceu.
- Ah, mas não vou mesmo estar fazendo porcaria nenhuma de depósito. Como é que podem exigir que eu pague uma conta que ainda não venceu?
- A senhora quer estar conversando lá em cima?
Ao me ver exaltada, a garota, coitada, nervosa, queria me tirar da sala de atendimento, provavelmente para que os outros cliente não escutassem. Eu, emputecida, incorporei a Tati e quebrei barraco, respondi com a voz já elevada:
- Não! Eu quero estar ficando aqui, aliás, eu não vou estar saindo daqui enquanto não resolver isso.
- Lá em cima a senhora vai estar recebendo um atendimento melhor.
- Meu anjo, nem a pau! Vou estar ficando aqui nesta sala até que alguém competente para estar resolvendo, apareça.
Aquilo não é uma operadora, é uma piada. A supervisora, ou sei lá qual o nome que dão pro cargo, de pessoa física, tem um celular que quando você liga escuta a mensagem: “este número não está habilitado”. Básico! O diretor regional, o próprio sobrenome já diz tudo: Socorro. Aliás, desconfio que esses cargos sejam todos de faz de conta porque na MORTO não existe ninguém responsável por nada. Tudo, mas tudo mesmo, é em outro departamento. Meu telefone foi religado, mas será cortado em breve porque meu consumo é maior do que a média que eles estimaram ser meu ideal.
A operadora MORTO é especialista em constranger pessoas de bem, pessoas que costumam pagar suas contas em dia, talvez por terem como princípios a meta de levar vantagem em cima dos outros, acham que todos agem da mesma forma.
Escolha a MORTO, que você vai estar se sentindo realmente MORTO!


Editado por Adriana   às   7/22/2006 03:40:00 PM      |