Na Tribuna da Imprensa SANTOS (SP) - Não é que o mestre-de-obras Jackson Inácio da Silva não goste de seu irmão mais ilustre, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O fato é que ele separa eleição e família. Petista de carteirinha, é contra a reeleição. Essa foi uma das razões apresentadas para justificar o voto no tucano Geraldo Alckmin. "O PT sempre foi contra. É um jogo desigual, o candidato viaja com carro oficial, com avião do governo para fazer campanha e o povo que paga." Sua atitude de declarar publicamente o voto provocou estranheza. "Eu sou a favor de dar emprego, da dignidade, do salário no fim do mês. Esse negócio de Bolsa Família não é suficiente", comenta. Com uma renda mensal em torno de R$ 1.500, defende o trabalho e critica as políticas assistencialistas. Jackson, de 52 anos, um dos 15 irmãos vivos de Lula, é filho do mesmo pai. "Também somos primos por parte de mãe, pois nossas mães eram primas", conta. "Meu pai veio do Norte e trouxe a minha mãe junto, que na época tinha 13 anos, para trabalhar em São Paulo. Ele a respeitou, era amigo da família dela e eles só foram ter relação quando ela tinha 15 anos. A mãe do Lula ficou com alguns filhos lá no Nordeste. Sabe como é, depois de dois anos e com a mulher longe... coisa de nordestino. Mas meu pai foi o melhor pai do mundo, não tenho nada de mal para falar dele", explica.
Assim como o irmão costuma fazer nos palanques, Jackson destaca a honestidade do pai que nunca admitia falcatrua. "Seja pobre, mas seja honesto, ele nos ensinava", diz Jackson, para usar o fato como argumento aos irmãos que ligaram perguntando quanto tinha ganhado para dar entrevista falando no voto em Alckmin. Eu não me conformei quando perguntaram 'Nenê' (apelido de família), quanto você ganhou para dar essas entrevistas?. Daí respondi: 'claro que não ganhei nada, até parece que vocês não me conhecem...'". As mãos grossas de lidar com o cimento lembram a origem profissional. "Sou pedreiro, mestre de obras". Casado com Lusenilde, tem três filhos que enveredaram para o mesmo ramo. "O mais velho, de 28 anos, é arquiteto e mudou-se para o Espírito Santo há dois meses. Ele trabalha em uma empresa que projeta dutos para a Petrobras. Os outros dois moram comigo e fazem faculdade, o de 26 anos estuda engenharia civil e a de 23 faz arquitetura". Jackson conversa bem, é articulado e fala em um português coloquial, porém correto. "A gente estudou um pouco, tenho segundo grau e cursos técnicos em edificações e contabilidade", diz meio constrangido. Os filhos Ricardo e Renata, que moram com a família, não foram à chácara no dia da eleição. "Eles ficaram em casa fazendo trabalhos da faculdade", explica a mãe. Ambos trabalham durante a semana. "O menino é funcionário público estadual, é independente. A menina é estagiária. Ela colabora com R$ 300 para pagar a faculdade e eu intero R$ 500", diz Jackson. O domingo da eleição começou como qualquer outro dia para esse Inácio da Silva. Ele acordou às 5 e às 6 horas já estava cortando a grama em sua chácara, propriedade de 30 x 100 metros que comprou há oito anos na área rural de Mongaguá, no litoral sul de São Paulo, onde costuma passar os domingos. "Granja do Torto? Isso aqui está mais para Casa da Dinda", brinca, ao se referir à propriedade onde construiu uma "meia-água" com quarto, cozinha e banheiro. Não tocou na mata do lugar. Ao contrário, plantou ao lado pés de jambo, goiaba, morango, ameixa, banana, amora, pitanga, jaca e caju. Impaciente, hoje reclama da demora para as árvores crescerem. "A terra aqui é ruim, muito arenosa". O dia foi de churrasco com alguns parentes de Lusenilde. Além de "assar uma carninha", Jackson também gosta de pescar traíras no lago de um metro de profundidade que ele e o filho cavaram. Mas quanto às "traíras" do governo de seu irmão, o pedreiro é mais duro. "Quando o Lula soube da corrupção, deveria ter feito um auditoria e vasculhado tudo, virado tudo no avesso igual a uma alcachofra, para então começar de novo. O erro dele foi não ter pegado pessoas mais sábias para ajudá-lo, em vez de seus companheiros". Ele também contesta o fato de Lula dizer que "não sabia". "Isso não existe, não sabia e continuou não sabendo depois que as provas foram aparecendo? Político não pode ser ingênuo". Ele mesmo não se acha ingênuo. Tentou entrar para a vida pública. Foi candidato por duas vezes a vereador de Mongaguá. Em 2004, conseguiu 16 votos. "Você sabe como é campanha com pouco dinheiro, mas pelo menos dobrei o número de votos, fiz uma projeção e se continuar assim em 2032 eu consigo uma vaga na Câmara", satiriza. Hoje quer distância da política. A aversão surgiu a partir das primeiras denúncias de corrupção no governo. "Foi quando Roberto Jefferson veio com a história do mensalão. O PT não poderia ter feito isso. Quem não roubou foi conivente, omisso". Como protesto, o irmão do presidente não votou em nenhum petista nessas eleições. Entretanto, continua filiado ao partido. "Eles não vão me expulsar como fizeram com a Heloísa Helena, sou peixe pequeno". Jackson é evangélico. Há plaquinhas com as frases "Leia a Bíblia" e "Só Cristo Salva" espalhadas pelo gramado de sua chácara. Ele tem cargo na igreja presbiteriana. É diácono. Mas atualmente freqüenta uma igreja batista em Mongaguá, para não ter que viajar até a presbiteriana, que fica na vizinha Itanhaém. Ele também é corintiano, como toda a sua família. "Só tem um são-paulino, um palmeirense, o resto é tudo corintiano". Jackson diz que nunca aprendeu a jogar bola direito, diferentemente de seu irmão, que costuma gabar-se de suas habilidades futebolísticas. "O Lula até que jogava bem, mas ele mais caía do que jogava de verdade", entrega. Nas urnas, o irmão de Jackson não caiu. Reeleito com mais de 58 milhões de votos, frustrou os planos do irmão oponente, que pretendia fazer uma feijoada para comemorar a vitória de Alckmin. "Quando Lula foi eleito da primeira vez, o pessoal prometeu vir aqui comer uma feijoada com a gente, não vieram e tivemos que comer feijoada a semana inteira". Faz quatro anos que os dois não conversam. "A última vez que eu falei com ele foi no dia da posse, quando eu e a minha família viajamos no meu Fusca até Brasília". O carro, apelidado de "Lulamóvel", atualmente está sendo reformado. Jackson usa seu outro veículo, um Escort ano 91.
Votos de Jackcson Presidente: Geraldo Alckmin (PSDB) Governador: José Serra (PSDB) Senador: Guilherme Afif Domingos (PFL) Deputado Federal: Vicente Cascione (PTB) Deputado Estadual: Sandra Arantes do Nascimento (PSC) (a filha de Pelé, falecida em 17/10) * Dos candidatos que Jackson votou nessas eleições, apenas José Serra foi eleito.
Editado por Giulio Sanmartini às 11/02/2006 01:59:00 AM |
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