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AS INÚMERAS FACES DA IMPUNIDADE
Editorial em O Estado de São Paulo

A impunidade, no Brasil, tem inúmeras faces. Existe a da pizza, a do engavetamento de inquéritos por funcionários venais, a da protelação deliberada de decisões judiciais - meras amostras de uma infinidade deplorável de situações para todos os gostos (mas nem para todos os bolsos), dando mais que nunca razão ao grande criminalista italiano Cesare Beccaria (1738-1794), que ensinava que 'o que intimida o bandido e diminui a criminalidade não é o tamanho da pena, mas a certeza da punição'. O exemplo da hora é o dos mensaleiros denunciados ao STF pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, há um ano e três meses.
Ele remeteu o inquérito ao STF, como lhe competia, pela natureza dos delitos e pelo fato de que diversos dos acusados de pertencer à 'sofisticada organização criminosa', conforme a inequívoca definição do procurador, eram autoridades e parlamentares aos quais se aplica o instituto do foro especial. A prerrogativa foi criada para impedir que servidores dos mais altos escalões da República e detentores de mandatos eletivos sejam assolados por processos com intenções torpes em tribunais de primeira instância em qualquer ponto do território. Nunca se imaginou, evidentemente, que um dia isso faria desabar sobre o Supremo um inquérito envolvendo 40 suspeitos de uma penca de delitos.
Ora, o STF é um tribunal constitucional - concebido e estruturado para julgar se uma lei ou ato de governo é coerente ou conflita com a Carta em que se fundamenta o Estado de Direito. Portanto, não é sua vocação, como dizem os juristas, conduzir processos criminais, principalmente nessa ordem de grandeza. Acontece, em conseqüência, o que era de prever. O ministro Joaquim Barbosa, relator do feito, acaba de admitir que só no próximo ano a corte acatará a petição para a abertura de ações criminais contra os operadores e beneficiários do suborno de políticos pelo esquema petista de poder, sob o presumível comando do então ministro José Dirceu.
O caso ainda está na fase de diligências. Nenhum dos acusados foi ouvido, embora tenham todos encaminhado as suas defesas prévias. Na semana passada, o STF decidiu manter no seu âmbito as investigações sobre os deputados e demais suspeitos a eles ligados. De fato, seria um contra-senso transferir para outra alçada a apuração do envolvimento no escândalo de um assessor ou parente de um parlamentar citado nos autos. Estima-se que, dos 40 casos, somente menos de meia dúzia será transferido. Os nomes serão conhecidos por esses dias. Depois, se - e quando - a denúncia do procurador for aceita, calcula-se que o tribunal precisará interrogar uma centena e meia de pessoas, somando os já então réus e as suas testemunhas.
Pelo andar da carruagem - a expressão vem a calhar -, é provável que os delitos prescrevam antes que os culpados paguem por eles. Aqui, o problema é de incompatibilidade entre a razão de ser de um tribunal e a atípica matéria sobre a qual deverá se manifestar.
Muitos outros, porém, são os primeiros sinais de que também poderão salvar a sua pele os 'aloprados' do escândalo do dossiê antitucano, gerado nas entranhas do comitê reeleitoral do presidente Lula. Passados dois meses da apreensão do R$ 1,75 milhão com que um araponga e um arrecadador de fundos do PT pagariam ao sanguessuga Luiz Antonio Vedoin pela baixeza, a Polícia Federal (PF) se diz sem elementos para indiciar quem quer que seja da não exatamente sofisticada organização petista.
O órgão, que em fins de outubro chegou a anunciar o indiciamento dos companheiros que participaram da operação, prepara-se agora para pedir, pela segunda vez, a prorrogação das investigações por mais um mês, no mínimo. (O prazo renovado expira no dia 26.) Relatório parcial concluiu que a vilania foi articulada pelo coordenador da área de análise de risco e mídia (sic) do comitê lulista, o churrasqueiro presidencial Jorge Lorenzetti. Mas ninguém foi autuado. 'Sem saber a origem do dinheiro, não temos como fechar o inquérito', diz o delegado Diógenes Curado, da PF de Cuiabá. O dinheiro, ao que se supõe, teria vindo de um caixa 2 do PT paulista.
'O caso é um quebra-cabeça', resigna-se o procurador federal Mario Lúcio Avelar, cujo pedido de prisão dos suspeitos foi rejeitado.


Editado por Giulio Sanmartini   às   11/17/2006 03:52:00 AM      |