Por Dora Kramer Em O Estado de São Paulo
Ao reivindicar do presidente Luiz Inácio da Silva a manutenção de seus espaços no governo e até mesmo no Parlamento, o PT não faz um movimento hostil em relação a ele. Faz apenas o que todo político e partido faz: briga por seus interesses. O problema dessa querência agora é justamente a 'poderência'. O todo-poderoso PT do início do primeiro mandato de Lula, que levou 19 ministérios mais a presidência da Câmara sem contestação de qualquer natureza, hoje é um partido sem comando, sem eixo e desprovido de seu núcleo de tomada de decisões, todo ele dizimado pelos escândalos de corrupção. O atual presidente de direito, Ricardo Berzoini, está afastado por envolvimento com o caso do dossiê. O presidente de fato é um assessor presidencial, Marco Aurélio Garcia, que numa situação de impasse evidentemente tende a firmar ao lado do governo e não do partido.
O PT chegou, portanto, ao ponto máximo de dependência governamental, tornando-se a legenda estatizada que quatro anos atrás o então presidente José Genoino anunciava como um risco a ser evitado. Nessa condição, pode muito pouco. Não dispõe de força política nem de unidade suficientes para obter mais do que o presidente estiver disposto a conceder. Os petistas argumentam que saíram fortes das urnas, mas o Palácio do Planalto pode também argumentar que essa fortaleza deve-se ao desempenho de Lula, na campanha inicialmente refratário e depois mais petista do que nunca. Foi ele quem ajudou o PT a se recuperar nas urnas e, sendo assim, se alguém deve algo a alguém, é o partido ao presidente e não o oposto. As manifestações oficiais logo após a reunião de ontem entre Lula e parte da comissão executiva não surpreenderam. Foram amenas e amigáveis como esperado, pois se há uma coisa que Lula sabe fazer é administrar conflitos no PT. Fez isso a vida toda e tirou sempre partido disso. Agora, se realmente nesse encontro ninguém pediu nada, como disse Marco Aurélio Garcia, os petistas presentes não representaram de forma real o que se passa nas bancadas da Câmara e do Senado. Lá, há insatisfação sim e grande. Mas nada que denote disposição de litígio com o presidente da República. O temor é o de o partido ser 'engolido' pelo PMDB. Mas o problema é como agir. Sem eixo de comando a ação política fica muito prejudicada e acaba prevalecendo a ausência de unidade sobre que atitude tomar. Há pelos menos três correntes de pensamento: uma quer briga, defende uma atitude mais agressiva; outra adota a mesma posição, mas, por uma questão tática, pressiona para ajudar o presidente a resistir à voracidade fisiológica do PMDB. Uma terceira acha que o melhor é ficar em silêncio para não atrapalhar Lula. Como o comando desfeito não foi refeito e o presidente em exercício deve subordinação ao Planalto, o PT fica sem uma linha de condução, as correntes de opinião se manifestam, mas não conseguem transformar seus desejos numa linha de ação objetiva e conseqüente. A recuperação do partido implicaria, evidentemente, a reconstrução de seu núcleo de poder. Mas, como fazê-lo sem criar dificuldades política para o governo? É um dilema no momento e, tudo indica, pelos próximos quatro anos, sem solução. Preservadas as peculiaridades e a história de cada um, foi mais ou menos o que aconteceu com o PSDB em função dos oito anos em que foi o partido do presidente da República. A legenda se descaracterizou, deixou suas energias serem sugadas na prestação de serviços ao governo e agora sofre danos não por estar dividida, mas, assim como vai acontecendo com o PT no tocante ao rumo de sua ação política, inteiramente perdido
Editado por Giulio Sanmartini às 11/17/2006 03:46:00 AM |
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