Entrevistas
Arthur Virgílio
Gerson Camata
Júlio Campos
Roberto Romano - 1ª parte
Roberto Romano - 2ª parte
Eluise Dorileo Guedes
Eduardo Mahon
p&p recomenda
Textos recentes
Arquivo p&p
  
O PAÍS REAL SUMIU DA CAMPANHA
Por Villas-Bôas Corrêa em a Voz da Serra
Entrego os pontos, dou a mão à palmatória: errei ao apostar que os debates entre Lula e Alckmin para a decisão do segundo turno não apenas aqueceriam a campanha como escancarariam a oportunidade para o confronto de propostas para a solução dos nossos problemas crônicos, agravados ao limite da ameaça de crise institucional.
Claro, não descartei a desejável hipótese do aprofundamento das críticas à escalada da corrupção, que atinge picos como “nunca se viu na história deste país”. Mas não esperava a virtual exclusividade da troca de acusações, farpas e injúrias entre o candidato-presidente que nada viu, de nada sabe e tem raiva de quem sabe e ainda cutuca o oposicionista, encurralado no canto de azarão.
Lula abandonou na estrada a tática de fujão, compareceu a debates e confirma que irá a mais três até o limite do prazo da lei.
A decepção chegou antes, em amarga frustração. Não iremos além do bate-boca, das insinuações de recíprocas velhacarias e das platitudes das venerandas obviedades, com o recheio da fingida eloqüência.
Não é que tudo que os finalistas vêm repetindo, como realejo dos meus tempos de menino, deva ser jogado no lixo. O que arregala os olhos de pasmo é a superficialidade das promessas de salvação da pátria e o esquecimento intencional de falsa malandragem ou – o que é mais provável e dramático – o desinteresse, para não dizer a ignorância, sobre os temas fundamentais, ausentes, postos em escanteio ou apenas mencionados, em surdina e de passagem, para marcar presença, como truque de estudante gazeteiro.
O país que está sendo exibido nas sessões da campanha é uma versão que seleciona as imagens do interesse de cada um e fecha os olhos para o quadro panorâmico do país real. Os milhões dos gratos a Lula pelo Bolsa Família que mata a fome crônica dos eternos esquecidos, dissolvem-se na população acuada pelo medo, escorraçada pela insegurança das avenidas, ruas e becos, que se protege atrás das grades das jaulas do vexame dos sitiados em suas casas e edifícios de apartamentos.
Anunciar paliativos comprovadamente insuficientes, embora necessários, como a construção de penitenciárias e cadeias é escapismo ou miopia.
A mesma maroteira na manipulação de estatísticas que sussurram as quedas dos índices do desmatamento da Amazônia, em meio ao festival de agressões ao meio ambiente que assola o país de ponta a ponta, onde quer que sobreviva uma moita de verde para as invasões de ricos, remediados ou dos esquadrões dos sem-terra.
O oba-oba eleitoral, afunilado no mano a mano do segundo turno, é o intervalo da mentira e da ilusão. A dura evidência, que se constata a olho nu em qualquer viagem por terra é a de um país angustiado pela sensação de que vive equilibrado na corda bamba do risco.
E é este país que merecia ser respeitado com a corajosa denúncia da extrema gravidade dos seus problemas. Desde o surto de otimismo que estimulou a migração que inverteu a pirâmide populacional em meio século, com o inchaço doentio das cidades e o esvaziamento do campo, que governos se sucedem no saltitante bailado de passos da coreografia democrática para as recaídas no calabouço das ditaduras, pairando na rama de grandes e médias obras pontuais. Ótimas para as fotografias e os filmes de propaganda.
Afinal, a realidade esmurra a porta, no desespero do medo. E as máscaras caem, uma a uma. O sistema penitenciário está falido, não recupera um marginal pé de chinelo na escola de crime de jaulas superlotadas, com presos dormindo em pé e sem qualquer programa de reabilitação.
As cidades, das megalópoles dos engarrafamentos de rotina às ruas do medo, corroem os costumes da nossa cultura tradicional com a pressão da angústia crônica.
Nas propostas de reforma política, as tramóias da habilidade propõem os retoques dos buracos da parede, como a cláusula da barreira para reduzir a farra das legendas, o fim da praga da reeleição, o voto distrital e o financiamento público de campanha quando o Congresso recordista em escândalos exige tratamento de choque. Tapeação de quem vira as costas para o desatino moral da farra das mordomias, vantagens, espertezas e benefícios – como a inqualificável verba indenizatória de R$ 15 mil mensais para ressarcir as despesas de suas excelências nos fins de semana nas bases eleitorais, com tudo pago com a tunga na Viúva.
Nos três últimos debates no SBT, na Record e na Globo e mais entrevistas a jornais, revistas e emissoras de rádio, Lula e Alckmin têm a última chance de se reconciliar com a sociedade, descendo da perna-de-pau para a serragem do picadeiro e com a troca da baixaria e da enganação pela análise dos males crônicos do sumido país real.


Editado por Giulio Sanmartini   às   10/20/2006 01:00:00 AM      |