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LULA JUAN DA SILVA PERÓN
por Cândido Prunes em Mídia sem Máscara
S. Exa., o Presidente da República, já se comparou, ao longo do processo eleitoral, a diversos personagens da história. Mas faltou um importante tipo na sua galeria de espelhos: o do falecido presidente argentino Juan Perón.
Como se sabe, o Coronel Perón foi eleito presidente do país vizinho em 1946, conquistando 54% dos votos. A Argentina saíra rica da II Guerra Mundial, tanto que Perón reconhecera que entrou no Banco de la Nación “tropeçando” em barras de ouro. Não havia na observação exageros. As reservas de ouro e moedas conversíveis atingiam a quantia de US$ 1,2 bilhão, à qual se somavam US$ 0,43 bilhão de moedas bloqueadas. Tanto a agricultura quanto a indústria vinham trabalhando a toda carga atendendo aos mercados interno e externo.
O cenário econômico mundial do pós-guerra não poderia ser mais favorável para um país como a Argentina: excedentes agrícolas disponíveis e um parque industrial moderno, inclusive com tecnologia de ponta, que geravam empregos e garantiam uma balança comercial superavitária. Tanto que europeus em massa acorriam para Buenos Aires em busca de prosperidade.
Mas o governo do Coronel Perón implementou uma agenda socialista. O Estado argentino passou a ser um agente da distribuição de riqueza (na verdade, inchando a burocracia assistencialista, sem resolver o problema da miséria). Os sindicatos foram fortalecidos conseguindo, a força de greves, elevados ganhos reais (correspondentes a 70% no período 1945-49). Diversas gangues de criminosos se instalaram no poder, a principal delas liderada pela Primeira Dama e seu irmão. Ela foi provavelmente a primeira na América do Sul a empregar a técnica de extrair recursos do Tesouro por meio de uma ONG, no caso, a fundação que levava seu próprio nome. O aparelho estatal argentino foi “peronizado”, incluindo as universidades e a mídia. Até a Suprema Corte perdeu autonomia. As despesas públicas na Argentina dispararam no período, elevando-se para 34,3% do PIB em 1947-48, quase o dobro do verificado três anos antes.
Os resultados não poderiam ter sido mais desastrosos. O PIB per capita argentino declinou em 1948, 1949, 1950 e 1952. As exportações argentinas, que representavam 30% do PIB em 1928, caíram para menos de 10% em 1955. As importações caíram pela metade entre 1945 e 1952. As áreas cultivadas de trigo, milho e aveia também sofreram drásticas reduções. Como conseqüência do populismo-assistencialista peronista, a Argentina foi o país de menor crescimento econômico no período entre 1955 – 1974 (40%, contra 120% do Brasil e 180% da Espanha, no mesmo período). A excessiva regulamentação da economia, a burocracia xenófoba e a inflação afastaram os investimentos estrangeiros. Quando em 19 de setembro de 1955 o Coronel Perón foi derrubado, a Argentina não era mais sombra do que fora e nunca mais voltaria a se recuperar. Viúvo, o principal protagonista do desastre econômico argentino exilou-se como milionário na Espanha. Parecia página virada na história.
Apesar da catástrofe produzida em seu país, o velho Coronel decidiu a ele retornar, disputando em 1973, novamente, uma eleição presidencial. Dessa vez ele cuidou de convocar sua segunda esposa Maria Estela Martinez de Perón (também conhecida como Isabelita) para disputar a vice-presidência. Sua maior credencial era ter sido dançarina de cabaré, na Cidade do Panamá, onde conheceu o Coronel exilado. Seu braço direito na Presidência era José López Rega, sinistra figura supostamente dotada de poderes mediúnicos e conhecida nos terreiros de umbanda do sul do Brasil. Ele seria nomeado para o poderoso Ministério do Bem-Estar Social. Esta dupla de peronistas roubaria bilhões de dólares até 1976, quando um golpe militar derrubou Isabelita. Condenado na Argentina, López Rega viveu como fugitivo da Interpol ao longo de quase duas décadas. Os bilhões desviados dos cofres públicos garantiram sua liberdade até que, acometido por um câncer incurável, entregou-se às autoridades argentinas. Isabelita, depois de alguns anos de prisão domiciliar, hoje vive como milionária na Espanha, gozando a fortuna amealhada pelo marido e o poderoso ministro de seu malfadado governo.
Mas o peronismo não morreu na Argentina. Apesar de haver destroçado o país duas vezes, uma nos anos 50 e outra nos anos 70, o velho espírito do “justicialismo” reencarnou em Carlos Menem e depois em Nestor Kirchner. A cada nova passagem desses socialistas portenhos pela Casa Rosada, os argentinos descem mais alguns degraus de nível de vida. Os vizinhos parecem não aprender a lição de que o Estado intervencionista só é capaz de beneficiar a burocracia que gerencia os programas de distribuição de riqueza ou de “eliminação da pobreza”. O país da América do Sul que outrora era o mais próspero, quase sem “descamisados”, há 60 anos vem “distribuindo” riqueza. O único resultado visível é a miséria que surgiu na periferia de Buenos Aires e que também se expõe nos semáforos e nas hordas de mendigos que passaram a habitar o centro da cidade.
Se re-eleito, o atual presidente brasileiro tem tudo para tornar-se o Perón do Brasil. Suas políticas continuarão a prejudicar os miseráveis e a esmagar a classe média. Mas o povo cego pelo seu carisma é capaz de sufragá-lo, achando que é um dos seus e que lutará pelo que é justo. E, mesmo depois de morto, não faltarão sucessores para continuar infelicitando a Nação em nome de velhos ideais que demonstraram ser tremendos fracassos.
O Lula-Perón é uma realidade. E, mesmo que perca as eleições em 29 de outubro, a ideologia que lhe move não estará desacreditada. O problema é que o Brasil não dispõe da riqueza que a Argentina se deu ao luxo de jogar fora na segunda metade do século XX. E nem tem uma elite tão ampla ou esclarecida capaz de identificar os prejuízos causados pelo intervencionismo estatal.


Editado por Giulio Sanmartini   às   10/12/2006 01:09:00 AM      |