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LEMBRANÇAS DE VIDA INTELIGENTE NO CINEMA
Laurence Bittencourt, jornalista

Quando o cineasta russo Serguei Eisenstein filmou “A greve” em 1924, num dos raros arrobos de ufanismo, Lênin se permitiu um entusiasmo e declarou: “o cinema é a mais importante das formas artísticas e, com a ajuda dos filmes, as pessoas serão levadas ao pensamento comunista e entusiasmadas para a realização das grandes tarefas, tomarão parte na construção da realidade do futuro, desfrutando ao mesmo tempo das variadas vantagens do estimulo artístico”. Fico imaginando o que diriam os teóricos da Escola de Frankfurt como Adorno (o mais radical deles), Marcuse, Horkheimer , etc, sobre a frase de Lênin. O líder da revolução de 1917 morreu naquele mesmo ano (1924), mas acho que se vivo fosse, teria se arrependido amargamente.
O certo é que Eisenstein logo depois filmou a série histórica, “O encouraçado Potemkin” (1925), “Outubro” (1928) e o monumental “Alexandre Nevsky” (1938), tornando-se uma lenda, um mito, na história do cinema mundial, gravando definitivamente seu nome na galeria dos grandes revolucionários da sétima arte.
O incrível nos filmes de Eisenstein é que eles foram saudados na Europa (saudado e aceito) e principalmente nos EUA. A repercussão que sua película “Alexandre Nevsky” causou na sociedade americana foi tamanha, que levou o presidente Franklin Delano Roosevelt a exigir a filmagem na Casa Branca. E assim foi feito.
O sucesso do cineasta russo levou em 1941 o Índice Cinematográfico Norte-Americano a colocá-lo entre as quatro figuras mais importantes na história do cinema mundial, ao lado de Charles Chaplin, D. W. Grifftin e Mary Pickford.
No entanto, e aqui começa o contraditório, o sucesso artístico de Eisenstein não livrou seus filmes de sofrerem censuras. Mas quem os censurou? Que países? Foram os EUA? Claro que não. Primeiro foi a Alemanha nazista e segundo a Itália fascista, e em ambos os casos sob a alegação e acusação de que tais filmes faziam apologia do comunismo. Pode?
Onde mais os filmes do cineasta russos sofreram censura e veto? Foi aqui no Brasil. Exatamente aqui no Brasil, através do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), do Estado Novo. Alguma semelhança entre as nossas raízes e o totalitarismo dos países fascistas? É interessante pelo menos pensar.
Mas a censura à arte sempre foi um moto contínuo na história da humanidade. Basta lembrar que o divino Platão proibiu os poetas de entrarem na sua República ideal, porque não via utilidade coletiva para os mesmos, sendo os poetas refratários a ordem total. Por outro lado, Dostoievski que havia sido um dos ídolos de todos os revolucionários soviéticos de 1917, depois da revolução e com a morte Lênin e a ascensão de Stalin ao poder, esse baniu o criador de “Os irmãos Karamazov”, alegando ser Dostoievski uma péssima influência ao socialismo nascente (sic). Pode isso?
O cinema claro, tornou-se hoje um grande passatempo e um mero entretenimento com o fortalecimento da indústria hollywoodiana, mas é inegável que o brinquedinho inventado (em definitivo) pelos irmãos Lumière (August e Louis), permitiu (e ainda permite, embora raramente) alguma das mais brilhantes criações que a fantasia humana já inventou. E Serguei Eisenstein figura entre esses expoentes. Resolvi escrever este texto depois de assistir a poucos dias “Ivan, o terrível”, outra marca do cineasta russo, que imprimiu de vez uma nova linguagem do cinema, alguns dizem que se trata do James Joyce do cinema, e que calcou a frase famosa, baseada em Maiakovski de que “sem forma revolucionária, não há arte revolucionaria”, influenciando desde Orson Welles, passando por Bunuel, até o mais recente, Tarantino. Se o cinema se transformou num kitsch meramente comercial, ainda assim, vez ou outra é possível recordar e encontrar vida inteligente na sétima arte, que fuja aos padrões infantilóides, ou ao ideologismo propagandistico.


Editado por Adriana   às   8/16/2006 11:40:00 PM      |