Por Roberto Macedo em O Estado de São Paulo
Como a maioria dos eleitores seguiu o que pregava a propaganda eleitoral de Lula, isto é, deixem o homem trabalhar - ainda que sem esclarecer como e para fazer o quê -, a grande questão é saber o que ele vai fazer no seu segundo mandato. Assim que o recebeu, foi descansar e, de volta a Brasília, mandou priorizar obras de infra-estrutura em andamento para construir e/ou reformar estradas, portos e hidrelétricas. Se essas obras fossem muito mais amplas do que as atuais, isso seria música para os ouvidos deste economista, preocupado com o pífio crescimento da economia brasileira e sabendo que sem investimentos como esses e outros ela não sairá dessa mediocridade. Ainda ontem veio outra má notícia, a de que a produção industrial caiu em setembro, o que deve levar o PIB deste ano a um crescimento inferior a 3%. Logo ao voltar ao posto, o presidente também falou a empresários e afirmou que se vai empenhar pelo crescimento. Mas está longe de esclarecer sua estratégia e, mais ainda, as muitas ações que precisará desencadear para levá-la adiante. Por isso tenho lido com renovada atenção seus pronunciamentos, procurando pistas do que seria um Lula caminhando nessa direção.
Do que vi até aqui, as conclusões não são boas, pois segue predominantemente preocupado em distribuir aos pobres mais dinheiro arrecadado dos contribuintes do que em utilizá-lo com maior equilíbrio, se priorizasse os investimentos públicos no seu segundo mandato. No artigo da semana passada, mostramos que sua visão do crescimento econômico se sustenta na convicção simplista de que ele decorre de suas políticas distributivas. Assim, na primeira fala pós-eleitoral afirmou: “... Provamos que com um pouco de distribuição de renda ... o Bolsa-Família ... o salário mínimo ..., a loja começa a vender ..., a comprar da fábrica, ... a fábrica a produzir, ... a gerar emprego ...” Ora, não se leva em conta que o dinheiro assim distribuído foi tirado de pessoas que deixaram de consumir e de investir. E mais: neste ano em que as preocupações eleitorais levaram a excessos dessa política, como os fortes aumento do salário mínimo e ampliação do Bolsa-Família, o crescimento do PIB continua decepcionante. Já no referido encontro com empresários, afirmou que “o crescimento vai ajudar. O povo sendo ajudado vai ajudar a classe média, a classe média sendo ajudada vai ajudar os empresários, os empresários sendo ajudados vão ajudar todo mundo a viver bem”. Assim, além de tomar o crescimento como uma solução - e não a falta dele como um problema a resolver -, novamente acredita que o crescimento se fará por meio dessa ajuda aos mais pobres, como a seqüência de sua frase dá a entender. Falta-lhe compreender melhor o papel dos investimentos - no sentido de criação de capacidade produtiva adicional - no processo de crescimento econômico. É esse investimento que expande a oferta de bens e serviços, ao mesmo tempo que gera trabalho e renda, que no conjunto da economia ampliam a demanda de modo a absorver a produção expandida. É para os fracos investimentos que o diagnóstico do frágil crescimento converge, tanto nesses aspectos teóricos como na realidade dos números. O Brasil hoje investe cerca de 20% do PIB para ampliar sua capacidade produtiva. A China, que lidera o mundo em matéria de crescimento, investe cerca de 40%. A Índia, que também se destaca pelo seu crescimento, investe perto de 30%. Quando o Brasil cresceu bem mais, como no período 1968-1973, seu investimento alcançou cerca de 25% do PIB, e por outra razão foi ainda maior que o atual, pois há evidências de que os preços dos bens de capital cresceram mais que os preços em geral. Às vezes Lula parece perceber a importância dos investimentos e a mecânica do crescimento, como na prioridade atribuída às obras de infra-estrutura no seu retorno a Brasília. Na mesma ocasião, disse desejar da ministra do Meio Ambiente maior rapidez na concessão das licenças ambientais para essas obras. É por aí, pois investimento e crescimento são medidos por unidade de tempo. Por exemplo, nosso PIB deste ano. Quanto menos tempo se tomar para produzir um mesmo PIB, maior será o seu valor anual. Esse é o conceito de produtividade, outro motor do crescimento. Entretanto, no pensamento econômico do presidente predomina a vocação de “pai dos pobres”, apenas com esses lampejos em que surgem o investimento e o crescimento. Só estes dois são capazes de libertar a pobreza dessa e de outras paternidades, pois seria eliminada ou aliviada pelo trabalho, pelo rendimento e pela dignidade que vêm junto, ao contrário do caráter assistencialista que tipifica os programas tão a gosto do presidente. Minha esperança é que ele ouça mais os interlocutores capazes de orientá-lo a fazer uma escolha mais equilibrada entre crescimento e distribuição. Mesmo disposto a trabalhar, pode novamente se atrapalhar e continuar levando o Brasil por caminhos econômica e socialmente equivocados. No seu primeiro mandato, atrapalhou-se, ainda que não eleitoralmente, optando por uma solução desequilibrada. Foi reeleito, mas a um custo elevado em termos de um PIB que poderia ter crescido bem mais, particularmente por conta do cenário externo favorável, do qual melhor se aproveitaram muitos outros países. Agora, ao embarcar no segundo mandato, Lula sabe que ao finalizá-lo chegará a seu lugar na História. Esta reserva um de destaque para o presidente que recolocar o Brasil na trilha de um crescimento econômico muito acima do que mostra hoje, alinhado com a rapidez com que já caminhou no passado e com a dos muitos países que passaram à sua frente desde 1980. É hora de decidir aonde quer chegar.
Editado por Giulio Sanmartini às 11/09/2006 09:23:00 AM |
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