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APROVEITE O CELULAR, PRESIDENTE
Por Augusto Nunes no Jornal do Brasil
O presidente da República já informou que, se não fosse Lula, gostaria de ser Juscelino Kubitschek. O destino não permitiu a JK tratar desse assunto, mas a hipótese contrária parece insensata. Ele não desejaria ser Lula. A evidente distância entre ambos ganha dimensões abissais quando o Grande Pastor assume a liderança da vanguarda do atraso e desanda no ataque a medidas que modernizaram o Brasil
A privatização de estatais, por exemplo. "Eu não teria vendido as telefônicas", exemplificou Lula ao infiltrar o tema na campanha eleitoral. JK diria que, se a transferência das empresas para a iniciativa privada merece, na forma, alguns reparos, foi exemplarmente acertada no conteúdo.
A decisão livrou o mamute federal dos tumores disseminados por monstrengos ineptos, gulosos, envelhecidos, envilecidos, condenados à morte por inanição. Até 1997, quase 30 siglas - cabides de empregos para apadrinhados, gazuas manejadas por bandidos amigos - submeteram milhões de brasileiros à mudez, à estática e à extorsão.
Para escapar das filas medonhas, formadas por interessados na aquisição de linhas fixas, multidões de contribuintes consumiram fortunas em transações pinçadas nas páginas de classificados. A privatização dos feudos odiosos universalizou o acesso ao telefone e encerrou a era do abuso.
Caso tivesse vivido para utilizar os pequenos aparelhos hoje ao alcance do Brasil inteiro, JK decerto daria um recado a Lula: "Aproveite o celular, colega". Só não recomendaria a imediata suspensão de frases alopradas porque JK, ao contrário do herdeiro, era homem educado. Era gente fina.
A polidez o impediria de lembrar ao atual presidente que também a privatização da Vale do Rio Doce foi uma ótima idéia. "Eu não teria vendido", repete Lula. "Principalmente por um preço tão baixo". O preço, como ocorre nos leilões públicos, resultou das leis do mercado.
O valor da empresa acusou saltos extraordinários justamente por ter sido privatizada. "Se a Vale tivesse continuado estatal, hoje não seria a segunda maior siderúrgica do mundo, mas uma empresa a ser comprada", resume o economista William Eid, coordenador de um bem-vindo levantamento produzido pela Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas.
O estudo avisa que a Vale, como quase todas as outras estatais privatizadas, tornou-se bem mais eficiente, lucrativa e financeiramente saudável. O investimento programado para este ano, por exemplo, soma US$ 4,6 bilhões. É 10 vezes superior ao registrado em 1997. Ganhou o governo, que passou a receber impostos antes sonegados. Ganharam os acionistas, agora beneficiados por lucros substanciais. E ganharam os trabalhadores. Os funcionários da Vale eram 11 mil no ano da privatização. Hoje, passam de 44 mil. Lula talvez não saiba disso. Ele nunca sabe de nada.
Sim, o presidente é incapaz de poupar a lógica e a sensatez. Deveria ao menos poupar JK.


Editado por Giulio Sanmartini   às   10/29/2006 01:55:00 AM      |