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O MAU EXEMPLO DA REDE GLOBO
Por Adelson Elias Vasconcellos em Comentando a Notícia
Confesso que fiquei estarrecido diante da entrevista realizada pela Rede Globo de Televisão com o candidato pelo PSDB à presidência, Geraldo Alckmin. Primeiro, pelo conteúdo das 10 perguntas. Estando a menos de dois meses da eleição mais importante do país, diante do quadro crítico no cenário político brasileiro e que se vem vivendo com lamentável intensidade há mais de um ano, a Globo poderia ter colaborado um pouco para permitir ao eleitorado uma melhor chance de avaliação em relação aos candidatos, dando à campanha presidencial, ao menos, uma melhor oxigenação, elevando o nível da baixaria para o terreno construtivo de idéias, projetos e programas. Pelo menos, com Alckmin, a Rede Globo naufragou. Não sei se o que vimos ontem, no Jornal Nacional, será a tônica em relação aos demais candidatos. E mesmo que seja, ainda que alegue em seu favor estar sendo imparcial e equânime, a Rede Globo poderia ter prestado aos seus telespectadores um melhor serviço de esclarecimento se deixasse de lado, um pouco ao menos, as baixarias do troca-troca de acusações múltiplas de múltiplos escândalos, e permitisse aos candidatos a exposição de plataformas, de projetos e de propostas para as questões mais emergenciais do País.
Willian Bonner e Fátima Bernardes talvez não possam ser responsabilizados pelas perguntas feitas a Geraldo Alckmin, mas o tom inquisitorial, muito longe esteve de ser jornalístico. E aí, a atitude de ambos é, no mínimo, questionável. A impressão que se tinha era a de estarmos dentro de uma mórbida sala ou porões da Santa Inquisição, ou mesmo mais modernamente, dentro das câmaras dos horrores e baixarias patrocinados pelos parlamentares em algumas CPI’s transmitidas pela TV, no auge do escândalo do mensalão. Patético, soa muito estranha a tentativa premeditada dos apresentadores de se colocar o candidato do PSDB acuado e sempre em defesa. Apenas uma única pergunta sobre o seu projeto de governo, e em um total de 10, convenhamos, em nada contribui para uma campanha que resvala diariamente para baixaria e total esvaziamento. E, se tal não bastasse, a contundência e esmero em acuar o candidato, a Rede Globo mais uma vez deixou a terrível suspeita de já ter feito sua escolha, pelo menos em relação ao seu candidato preferencial à presidência da república.
Ou será que para a Central Globo de Jornalismo a situação do país está muito boa, não temos nenhum tipo de problema, e que as eleições presidenciais merecem mesmo uma campanha de baixo nível, sem discussão de programas e projetos, um campanha vazia e se que se resvala, invariavelmente, para o nível baixo da política rasteira que se pratica no Brasil ?
Mesmo que a Rede Globo de Televisão diante de Lula tenha o mesmo comportamento, dirigindo-lhe de 10, pelo menos 9 perguntas acusatórias e de respostas pré-dirigidas à acusações, ainda assim, é de se lamentar ainda mais sua atitude e o caminho que escolheu para conduzir, tanto em forma quanto em conteúdo, suas entrevistas com os candidatos. Lamentável o papel, deplorável o comportamento, insignificante como informação e esclarecimento.
E esta não é uma opinião pessoal, levada pela emoção ou pelo desejo de ter centrado em Geraldo Alckmin uma opção de voto. Éramos 25 pessoas, sentadas em volta de um aparelho de televisão, e dentre estas pessoas havia duas apaixonadas pelo projeto único de educação, do Cristovam Buarque, cinco pessoas seduzidas pela força e determinismo da senadora alagoana, Heloísa Helena, dez simpatizantes e alinhados à Geraldo Alckmin, e outras oito pessoas na base do “tô com Lula, e não abro”, e todas, de forma unânime, terminada a entrevista, nos olhamos boquiabertos, e um petista, universitário, 26 anos, leitor venerado de Marx, quebrou o silencio e perguntou-me: “Isto é entrevista ou inquisição?”. E ainda completou: “Se agirem com o Lula assim, tamo ferrado, camarada .” E este é o sentimento que, minutos após, espalhou-se pela internet. Diante disso, é de se perguntar: a que propósito se presta a Rede Globo de Televisão com entrevistas totalmente deprimentes ? Porque não se pode qualificar aquilo que se viu no Jornal Nacional como o bom e velho jornalismo informativo ! Ah, por certo não! Muito longe disto, porque podendo dar oportunidade de se discutir propostas, idéias e programas, dedicar 9 entre 10 perguntas à prólogos acusatórios, convenhamos, fica tendencioso demais. E mesmo que a Globo, quando chegada a vez de Lula, lhe dirija 9 perguntas em tons de acusações relativas aos escândalos que pipocaram no seu governo , o que particularmente duvidamos que a Globo o faça, e tenham os apresentadores a mesma postura inquisitória e contundente que tiveram em relação a Alckmin, em resumo, ainda que haja imparcialidade e o tom do que se viu ontem seja mantido, ainda assim a Globo terá escancarado para o país o nível que está buscando para esta campanha: de um lado, a desinformação do eleitor que ficará sem opção ao lhe negarem o direito de ouvir dos candidatos idéias e programas, e de outro lado, por incentivar o baixo nível de acusações recíprocas, o bate-boca rasteiro e deseducado.

Péssima a colaboração prestada pela Rede Globo, que até poderá vir a público defender-se e se auto-imolar no panteão cínico de cultuadores da democracia e de que ali está com o propósito único de informar. Por certo, em algum de seus telejornais, utilizará parte do tempo, para ler um dos seus editoriais de auto-purificação, como sempre tem usualmente praticado a Rede Globo, em vários momentos em que foi criticada, pela opinião pública, por sua conduta e orientação jornalística. É um direito que lhe assiste concordar ou não com a crítica, bem como é um direito nosso criticá-la, também, quando entendemos estar desviando-se perigosamente de seus propósitos. Mas talvez tenha ficado apenas no propósito, porque na prática o que se viu foi bem diverso do que poderá alegar em seus editoriais. Jornalismo, senhores, é informação, e mesmo sendo crítica, não cabe à Globo ser deseducada diante de um processo de esclarecimento público em uma campanha presidencial. Não estamos escolhendo um organizador de rifa escolar, ou o síndico do prédio em que moramos. E mesmo nestes momentos, não se pode dispensar uma postura elegante e respeitosa. Estamos escolhendo a pessoa que comandará os destinos deste país pelos próximos quatro anos. De suas decisões, certas ou não, dependerá nossas mazelas continuarem nos afligindo ou não, encaminhando nossas vidas e a de nossos filhos. Prestar-se a um tom intimidatório e agressivo, mais de acusação do que de informação, abandonando totalmente o ideário que move cada um dos candidatos, deixando de dar oportunidade de se informar aos telespectadores quais programas serão dadas as melhores e maiores prioridades para que o eleitor, de soberana vontade e diante da informação qualificada, possa definir sua escolha, é transformar o canal de televisão em um ringue de baixarias, porque até em alguns palanques eleitorais é possível encontrar momentos de maior e melhor lucidez.

Porém, este foi o caminho escolhido pela Rede Globo de Televisão para patrocinar sua própria campanha. Esperamos que, de igual conteúdo acusatório e de igual esvaziamento de idéias, programas e projetos se conduzam as demais entrevistas, principalmente em relação ao Presidente Lula, porque por certo nove perguntas são poucas, e o tempo de responde-las insuficiente, para esclarecimento dos fatos suspeitos e concretos da corrupção sob seu governo. Pois do contrário, o jornalismo terá descido para o andar da manipulação interesseira, com conotações político-partidárias, ou terá sido por tal razão que o Ministério das Comunicações, comandado por ex-empregado da própria Rede Globo, o ministro Hélio Costa, terá optado pelo sistema japonês de televisão digital que era opção mais vantajosa do ponto de vista econômico para os canais de televisão no país ? Ou, a entrevista tendenciosa terá sido mera cortesia e agradecimento aos financiamentos obtidos por aquele canal de tevê junto ao BNDES? É de se conferir. Bem como, é de se lamentar o deplorável mau serviço prestado para o eleitor e que a Rede Globo protagonizou em seu Jornal Nacional. Senhores, ao nosso ver, isto não é democracia. Tal comportamento em seu propósito real se desloca para um terreno tão pantanoso quanto às negociatas suspeitas promovidas nos balcões de negócios escusos do parlamento brasileiro. E aí, não é com reforma política conduzida de forma arbitrária que conseguiremos elevar o tom e a qualidade da política brasileira. Ética é coisa que se possui não por decretos, mas sim por retidão de caráter, patrocinada por sólida educação devotada à princípios morais de respeito à lei e à ordem. E, neste sentido, a Rede Globo de Televisão, sem dúvida nenhuma, produziu um mau exemplo.



Editado por Giulio Sanmartini   às   8/09/2006 01:17:00 AM      |