Não é coisa comum. Em geral, petista acha que outro petista não pode nem ser investigado, como se estivessem acima do bem e do mal, acima dos mortais comuns. E o outro petista sobre quem se exige investigação também é da gema. Chama-se José Airton Cirilo. Já foi candidato ao governo do Ceará, já ocupou posto de comando numa agência reguladora no governo de Lula e pertence à direção nacional do PT. É candidato a deputado federal. E anda dizendo que, quando Lula visitar o Ceará, pretende subir em seu palanque eleitoral sem medo de ser feliz. Vai ser uma cena e tanto.
Quando VEJA publicou reportagem de capa sob o título "A lista da vergonha", com o devastador depoimento de Vedoin, ficou-se sabendo de detalhes da atuação de Cirilo na máfia dos sanguessugas. Ele é acusado de intermediar, junto ao Ministério da Saúde, a liberação de verba para a compra das ambulâncias superfaturadas. No seu périplo de sanguessuga, Cirilo é acusado de trabalhar ao lado de um assessor, José Caubi Diniz, e de um sobrinho, Raimundo Lacerda Filho. Cirilo admite que se encontrou algumas vezes com Vedoin, mas nega ter feito qualquer serviço – e nega com verve peremptória. Diz que a denúncia é "totalmente fantasiosa" e que é vítima de "uma campanha sórdida".
Pode ser. Mas Vedoin entregou agora à Justiça os fac-símiles reproduzidos neste texto. São trechos de sua planilha de controle, na qual ele registrava cada depósito em favor do assessor Diniz e do sobrinho Lacerda. Os depósitos não são apenas anotações, que Vedoin poderia ter inventado. Ele exibe os comprovantes dos depósitos registrados na planilha, o que dá ao papel uma solidez documental. Um detalhismo de lascar.
O primeiro depósito é de 1º de abril de 2003, no valor de 35 000 reais, para o sobrinho Lacerda. O segundo, também de 35 000 reais, saiu em 20 de abril, em favor do assessor Diniz. A ciranda vai até 5 de dezembro de 2003, quando 20 000 reais são enviados a uma empresa do sobrinho Lacerda, a MC Lacerda. Ao todo, a planilha lista 32 depósitos, que somam mais de 867 000 reais. Cirilo diz que o assessor e o sobrinho usaram seu nome para roubar.
Pode ser. A boa notícia é que, desta vez, até petista duvida.
Fonte: VEJA on-line (assinantes cliquem
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