Por Dora Kramer em O Estado de São Paulo
A condição imposta pelo presidente da República para ampliar a participação do PMDB no governo - a pacificação do partido - é o tipo do pré-requisito fadado a manter as coisas como estão: a interlocução com Lula em regime de exclusividade com o grupo capitaneado por José Sarney, Renan Calheiros, Jader Barbalho e companhia. Um atento e competentíssimo observador da nação pemedebista captou essa mensagem na sexta-feira, quando os senadores Sarney e Renan saíram de uma reunião com o presidente Luiz Inácio da Silva dizendo que, para o presidente, a conversa sobre ministério só chegaria a bom termo se antes o PMDB se apresentasse ao governo devidamente pacificado.
É algo parecido com a eterna questão a respeito da primazia de nascimento entre o ovo e a galinha. Como o presidente do partido, Michel Temer, vai na quarta-feira ao encontro do presidente levando consigo a preliminar de que a pacificação só ocorre se a conversa tiver por base a coalizão institucional, estará estabelecido o impasse: sem pacificação não há coalizão, que só ocorre mediante a pacificação. Conta de soma zero, portanto, é o que se deve esperar como resultado da reunião de Temer e Lula daqui a três dias. Aos poucos observadores independentes ainda existentes no PMDB parece claro que nenhum dos atuais e privilegiados interlocutores de Lula no partido está minimamente interessado em mudar essa situação. Para quê? Há 4 anos eles obtêm do presidente o que bem querem, sempre sob a promessa não cumprida de lhe garantir o PMDB por inteiro. Não seria agora que apostariam, e muito menos patrocinariam, uma interlocução colegiada, cujo primeiro efeito seria o da inclusão de novos participantes na divisão das benesses da até agora coalizão de Diário Oficial firmada entre governo e PMDB. Ainda assim, provavelmente ciente dessa situação, Michel Temer deve atender ao convite do presidente, feito depois que ele reclamou publicamente da ausência de um diálogo institucional nas negociações com seu partido e o Planalto. E por que vai, se sabe que sua presença tem, de acordo com as urdiduras dos chamados interlocutores tradicionais, o único objetivo de conferir às tratativas um verniz de institucionalidade? Porque tem sido cobrado fortemente por outros setores do partido que, ou querem participar do loteamento de cargos, ou têm sincera preocupação com o fato de o PMDB mais uma vez se oferecer como mercadoria ao poderoso de plantão. Vai também pela impossibilidade de, como presidente do partido, recusar o convite, oficializar a guerra interna e, dada a correlação de forças desfavorável a ele, acabar sendo derrubado da presidência. Temer irá para ouvir. Como foi na última reforma ministerial, avisando ao presidente Lula que levará suas propostas às instâncias formais do partido, a direção executiva ou o conselho político. Naquela ocasião, o presidente não gostou dessa condicionante e, estimulado por Sarney, Renan e Jader, deu por encerrado o assunto, alegando que Temer não era 'confiável'. Na época havia essa mesma conversa: o presidente do partido cobrando as bases programáticas da coalizão e o governo exigindo dele adesão total como precondição. Nada indica que desta vez as coisas serão diferentes, porque as condições são as mesmas. É como diz aquele atento e competentíssimo observador da nação pemedebista: 'A mesma farinha, o mesmo fermento, a mesma água, o mesmo forno, o mesmo padeiro só podem resultar no mesmo pão.' A única pessoa capaz de mudar esse roteiro é o próprio presidente da República. Mas, para isso, o impossível teria de acontecer: Lula aceitar livrar-se, neste assunto, da tutela dos três, digamos, mosqueteiros aos quais interessa qualquer coisa nesse mundo, menos que o governo tenha uma relação institucionalmente transparente com o PMDB.
Editado por Giulio Sanmartini às 11/19/2006 11:39:00 PM |
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