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PROCESSO ELEITORAL
Esta é uma interessante tese do Dr. Milton Córdova, advogado, pós-graduando em Direito Público e que brindará o p&p, enviando seus brilhantes textos. Proponho a todos uma discussão sobre o tema.
Milton, seja bem vindo ao nosso p&p. Adriana

FIDELIDADE PARTIDÁRIA

A questão levantada sobre a impossibilidade da diplomação do governador do MT, Blairo Maggi, em conseqüência de sua notória e explícita infidelidade partidária, provocou repercussão, de modo que entendi ser necessário avançar um pouco mais no tema, que, reconheço, é nebuloso porque inédito. Esse avanço será no campo da doutrina e da jurisprudência, ou seja, o que os estudiosos dizem sobre o assunto, mais o que os Tribunais já decidiram.
Relembrando o episódio, o governador Blairo Maggi desobedeceu decisão nacional de seu partido, o PPS, e resolveu, por conta própria apoiar, no segundo turno, candidato adversário – no caso, Lula. O PPS apóia o candidato Geraldo Alckmin. O governador agiu como se ele fosse o próprio Partido.
O Princípio da Fidelidade Partidária, estabelecido na Constituição, é da mesma natureza de outro princípio, estabelecido pelo TSE em 2002, o Princípio da Coerência, implementado em 2002 por ocasião da “verticalização”. Na verdade, entendemos que ambos os princípios são sinônimos. Não há diferença prática entre um e outro. Se há diferença, ela é a mesma que existe entre 6, seis e meia dúzia. Nenhuma diferença. Princípio da Coerência é o “nome de fantasia” do Princípio da Fidelidade Partidária”.
O Princípio da Coerência nas coligações partidárias, também conhecido como verticalização das coligações ou das eleições, entrou em vigor 2002 por meio de uma Resolução do TSE, que o regulamentou. O seu objetivo foi o de enfatizar o caráter nacional dos partidos políticos, tendo como resultado, nas eleições gerais (nacionais e estaduais), a determinação de que as coligações formadas dentro de cada Estado não poderão contrariar a coligação formada para a eleição presidencial, e nem contrariar a orientação partidária. Um candidato de um partido não pode apoiar, explicita ou implicitamente, candidato de outro partido. Não pode contrariar a decisão partidária. Tudo em conformidade ao princípio da fidelidade partidária.
Vale dizer que o TSE, ao emitir a Resolução, nada inovou ou inventou. Somente proferiu sua interpretação sobre o conteúdo da Constituição e da Legislação Eleitoral. Não legislou nem promulgou nova norma, somente pronunciou seu posicionamento a respeito das coligações, em face de seu Poder Regulamentar. A sua intenção, ao instituir a verticalização, foi inequívoca: a de garantir a coerência das coligações partidárias.
As razões que levaram à verticalização das coligações são as mesmas - resguardadas as devidas características e peculiaridades de um e de outro - do atual caso do governador Blairo Maggi, que se reelegeu para um segundo mandato, mas desobedeceu, de forma notória e expressa, orientação de seu partido, o PPS, antes da diplomação.
Lembremo-nos que processo eleitoral está em curso, pois se desenvolve em várias etapas. Não se esgota nas eleições. Sucintamente, temos o alistamento, filiação, registro da candidatura, eleição, diplomação e posse. Boa parte da doutrina entende que ele termina na diplomação; outra parte diz que vai até a posse. Desse modo, Blairo Maggi ainda não superou a penúltima fase do processo eleitoral, que é a diplomação. Ganhou, mas ainda não levou.
Pelas notícias que chegam, e segundo o presidente do PPS, o deputado Roberto freire, Blairo Maggi está desfiliado do PPS. Então, temos um problema a ser sanado: ele poderá ser diplomado?
Entendo, sem a menor dúvida, em face dos princípios da coerência e da fidelidade partidária, que não poderá ser diplomado. Ele está sem partido. Está desfiliado. É de sabença geral que a filiação partidária é condição de elegibilidade, e que o instituto da elegibilidade somente se justifica e encerra com a diplomação (ou posse, para alguns), que é sua condição sine qua non. Tudo em decorrência da razoabilidade, da Teoria dos Fatos Determinantes, que estabelece o nexo causal lógico entre um evento e outro. É a lei da causa e do efeito.
Se o TSE for justa e devidamente provocado, não poderá decidir de forma diversa daquela de 2002, quando estabeleceu o princípio da coerência. Caso contrário, estará sendo incoerente. Existe um pressuposto jurídico que diz: “onde há mesma razão de ser, há mesma razão de decidir”. Ou, “onde há mesma razão, há mesma disposição”.
Contudo, o TSE não age por contra própria, “de ofício”. Há que ser proposta a ação adequada, provocada pelas partes que têm legitimidade para tal: os partidos políticos, o Ministério Público. Considerando a leitura da posição manifestada por meio do deputado Roberto Freire, em desfavor de Blairo Maggi, não vislumbro parte mais adequada para intentar a ação que o próprio PPS.
De nada adianda o presidente do PPS fazer beicinho, espernear, bater os pés, esbravejar, mandar recados por meio da imprensa... e nada de concreto fazer. Apenas desfiliar ou expulsar o “infiel”, deixando-o no mandato, é a mesma coisa que nada fazer. O efeito prático é: nenhum, e as coisas continuarão a ser como são. Um mundo faz-de-conta, onde uma parte faz-de-conta que cumpre a lei, e a outra parte faz-de-conta que acredita que a outra parte cumpre a lei.
A sociedade está impaciente e indignada com a já abusiva infidelidade partidária, que já beira ao ridículo, beira à falta de moral e de caráter. Vale dizer que a infidelidade partidária equipara-se a um estelionato eleitoral, pois muitos eleitores, ao escolher os seus candidatos, o fazem também com alguma carga de ideologia.
Dessa forma, esses eleitores escolhem o candidato porque esse pertence a determinado partido político ou porque representa determinada ideologia. De repente, sem consulta ao povo que o elegeu, esse candidato “muda de lado”, como se estivesse trocando de camisa, de clube. Assim, o povo “escolheu alhos, mas levou bugalhos”.
O PPS não pode perder o trem da História, e deixar esse assunto passar ao largo. Deve propor a ação, no TSE, demonstrando para a sociedade que está realmente indignado com a situação. Ao propor a ação, suas conseqüências provocarão outro evento, tão ou mais importante: será introduzido, de uma vez por todas, na agenda política do Congresso Nacional, a questão da Reforma Política.


Editado por Adriana   às   10/26/2006 04:58:00 PM      |