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MAU ESPÍRITO
Por Fabio Grecchi na Tribuna da Imprensa
A Convenção de Miranda diz que todo acusado tem o direito de ficar em silêncio, pois o que disser pode ser usado no tribunal contra ele. Há uma imensa distância entre calar e mentir: no primeiro caso, o réu simplesmente não ajuda as investigações e leva a cabo a premissa do Direito de que ao acusador cabe o ônus da prova; no segundo, confunde as apurações e, de certa forma, obstrui as ações da Justiça. Feita esta diferenciação, expõe-se o erro do raciocínio do governador eleito da Bahia, Jaques Wagner.
Os "aloprados" envolvidos no escândalo do dossiê não têm o direito de mentir, como defendeu o ex-ministro da Coordenação Política. Ainda que sejam acusados, como todo e qualquer envolvido num crime. Tal entendimento distorcido das leis e de seu espírito é que tem feito o PT patinar na moralidade e se envolver nas mais assustadoras lambanças. O partido criou para si uma aura de infalibilidade, de repositório da ética, que hoje, se vê, acabou se transformando numa visão totalmente enviesada da legislação.
Reside aí a grande decepção do governo Lula. Ainda que não tenha sido um primor de avanços, já que a plataforma de governo de 2002 se baseava principalmente numa ausência de realidade que hoje já existe por parte do presidente, teve inegáveis avanços em relação ao seu antecessor. Mas a contrapartida disto foi a desonestidade intelectual na qual se envolveram vários expoentes do partido que está no poder, levando ao pé da letra a norma popular de que os fins justificam os meios. Uma leitura de Antonio Gramsci que em nada recomenda o pensador e filósofo italiano de esquerda.
Os desmandos nos quais os petistas se envolveram ao longo de quatro anos nada mais representam que a utilização do manto da lei para cometer as piores arbitrariedades. Fosse isto em épocas não muito distantes, teria se convertido numa ditadura. Vale lembrar que os regimes de força também tiveram suas legislações, que as interpretavam sempre em favor da supressão das liberdades e do favorecimento do grupo dominante. Sob tal ótica, se podia matar, desterrar, desapropriar, invadir aquilo que interessasse e representasse bem-estar do Estado. E que em vários episódios da história se chocou com o da população.
Neste momento as leis se tornavam igualmente farsas, já que tinham sido montadas à feição da manutenção de um status. Representa que a mentira, em qualquer tempo, é perniciosa, sobretudo quando elevada à condição de arma de defesa. Wagner erra crassamente quando defende o direito de os "aloprados" mentirem: ainda que não possam dizer a verdade, que paguem o preço apenas do silêncio, não o da obstrução da Justiça. Que serve sempre para a busca de soluções que ferem o Direito.
É justamente aí que costuma aparecer o fantasma da impunidade.


Editado por Giulio Sanmartini   às   10/25/2006 07:02:00 AM      |