Na Tribuna da Imprensa BRASÍLIA - Ao prometer "transparência absoluta" na prestação de contas dos cartões corporativos do governo e cobrar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a mesma atitude, o tucano Geraldo Alckmin falou de uma caixa preta que, só este ano, já envolve R$ 3,583 milhões. O presidente não quis falar no assunto. Limitou-se a dizer que os cartões corporativos foram "a única coisa boa que o Fernando Henrique Cardoso criou no governo dele". A Casa Civil da Presidência informou, por meio da assessoria de imprensa, que o sigilo é necessário porque envolve gastos com segurança de autoridades, inclusive o próprio presidente e sua família, e também de comitivas internacionais. Lembrou, porém, que o TCU "tem amplo acesso, a qualquer hora" a qualquer informação que solicitar ao governo.
Segundo a Casa Civil, dois tipos de gastos são pagos com o cartão: os chamados "de pequeno vulto", desde que não ultrapassem R$ 8 mil mensais, e "peculiaridades da Presidência da República". São vetadas, segundo a assessoria, "compras de caráter pessoal". Esses cartões de crédito permitem a alguns servidores sacar ou fazer pagamentos de rotina com recursos da União sem a necessidade de autorização prévia. Atualmente, só na Presidência, 22 funcionários usam o cartão. Na Secretaria de Administração da Presidência da República, foram gastos entre janeiro e setembro deste ano R$ 3,678 milhões com os cartões. A prestação de contas no Portal da Transparência da Presidência, no entanto, revela o destino de menos de R$ 95 mil (2,6%). Os 97,4% restantes estão guardados a sete chaves sob a rubrica "informações protegidas por sigilo, nos termos da legislação, para garantia da segurança da sociedade e do Estado". A Secretaria de Administração é a responsável pelos gastos do dia-a-dia do Gabinete da Presidência. Os pagamentos a que se tem acesso foram para despesas com combustível, hotel, pequenos consertos, feitos por nove funcionários que têm os cartões. Para os outros gastos, não há nenhuma informação. "É inaceitável que esse tipo de gasto com cartão tenha tratamento de segurança nacional", protesta o deputado distrital Augusto Carvalho, eleito deputado federal pelo PPS, presidente da ONG Contas Abertas. O parlamentar lembra que, na contabilidade da União, já existe a rubrica "despesa de caráter secreto ou reservado", onde está incluída parte dos gastos das Forças Armadas e do Itamaraty. Dos R$ 94.987,33 relacionados no Portal da Transparência, R$ 20 mil foram saques em dinheiro e também não há informação sobre onde foram gastos. Os gastos totais do Gabinete da Presidência por meio dos cartões corporativos foram de R$ 6,839 milhões entre janeiro e setembro deste ano. Das seis unidades subordinadas ao gabinete, tiveram gastos secretos a Secretaria de Administração e a Agência Brasileira de Informações (Abin). No caso da Abin, foram apontados como sigilosos os R$ 3,097 milhões gastos com os cartões. Os gastos e saques totais com os cartões corporativos da União somam R$ 20,756 milhões este ano, incluindo todos os ministérios e a Presidência. É quase o valor do ano passado inteiro, de R$ 21,706 milhões, e 46,6% maior que os R$ 14,1 milhões gastos em 2004, segundo dados do portal da presidência. O cartão corporativo foi criado em 1998 para facilitar pagamentos de rotina das autoridades. Por recomendação do Tribunal de Contas da União, houve avanços na transparência, mas a prerrogativa do sigilo para garantia de segurança emperra o acesso aos dados. No ano passado, o TCU abriu investigação sobre os gastos, que ainda está em curso. Dados sigilosos divulgados na época falavam em saques de mais de R$ 1 milhão feitos por um único funcionário, em 2004. Especulava-se também sobre gastos indevidos para a primeira-dama, Marisa, e os filhos do presidente. "O que todo mundo quer saber é se está havendo compras indevidas. Quanto mais se sonega a informação, mais cresce a curiosidade e a preocupação", diz Carvalho. "Se o candidato diz que vai quebrar o sigilo do cartão, vamos cobrar amanhã", avisa.
Editado por Giulio Sanmartini às 10/10/2006 01:18:00 AM |
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