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O NOME DA ROSA
por Mário César de Camargo no Jornal Cruzeiro do Sul
O "Nome da Rosa", primeiro romance do notável semiótico Humberto Eco, foi estrondoso sucesso editorial em todo o mundo, em 1980. Apenas para lembrar, a história se passa no final de 1327 e gira em torno de sucessivos crimes, cujo epicentro é a biblioteca de um mosteiro medieval italiano, a maior do mundo cristão. A riqueza de seu acervo contribui para explicar o título da obra, uma expressão usada na Idade Média para classificar o imenso poder das palavras. Poder, aliás, que se multiplicou após a invenção dos tipos móveis pelo alemão Gutenberg, por volta de 1450, à medida que a possibilidade de imprimir em escala democratizou a leitura.
Desde então, o livro tem sido o principal meio de difusão do conhecimento, da cultura, das ciências e da informação técnica. Porém, a partir do advento dos computadores e da internet, assiste-se a interminável debate, no qual a comunicação impressa e a digital são colocadas em posições antagônicas. Tal discussão, entretanto, ignora a realidade, pois as mídias eletrônicas, jornais, revistas e livros têm convivido em harmonia. Por isso, é fundamental analisar a questão de maneira menos maniqueísta e mais realista, focando as causas que, de fato, ameaçam o acesso à cultura e ao conhecimento no Brasil.
Ou seja, a exclusão social, o desemprego médio de 11%, a péssima distribuição de renda, a má qualidade do ensino público e o fato de 44,7% dos brasileiros ainda serem vítimas do analfabetismo (incluindo-se o funcional). Assim, não é mera coincidência que o índice de compra espontânea de livros seja inferior a um exemplar por habitante/ano, que 79% da população nunca tenha mexido num computador e 89% jamais navegado na internet. Em tempo: apenas 14,4% têm acesso regular a um microcomputador.
De nada adiantam propostas de fragmentar obras acadêmicas, retaliando-as digitalmente, para que alunos de baixa renda, inclusive universitários, possam ler por baixo preço apenas capítulos de maior interesse. Ora, o Brasil não precisa de meios doutores, meios cientistas e meios bacharéis; necessita, sim, de profissionais altamente qualificados, capazes de o resgatar dos porões da economia global. Além disto, independentemente de questões mercadológicas, o analfabetismo, a exclusão e a deficiência do ensino, típicos do terceiro mundo, ferem a auto-estima e o conceito de cidadania do povo brasileiro.
Para solucionar tamanhos problemas, mais do que tergiversar no falso dilema relativo à guerra entre o impresso e o digital, é necessário que todos façam sua parte, a começar pelo governo, que deve tornar cada vez mais abrangente o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), conforme está programado, ampliar o número de bibliotecas públicas e seus acervos, melhorar a qualidade do ensino gratuito, reduzir a repetência e a evasão escolares e substituir a mesmice monetarista dos juros e impostos abusivos e excludentes por uma política econômica voltada ao crescimento, à multiplicação de empregos e à distribuição de renda. É preciso ter consciência de que computadores e livros certamente não estão entre as prioridades de consumo dos que sequer têm poder aquisitivo para comprar e ingerir a quantidade mínima diária de proteínas recomendada pela Organização Mundial da Saúde.
Nesse contexto, o livro continua sendo meio de baixo custo para o acesso à informação e à leitura. O próprio PNLD é prova inconteste disso. O preço médio unitário dos cerca de 120 milhões de exemplares anuais comprados pelo governo gira em torno de R$ 4,50. Assim, é oportuna a extensão do programa ao ensino médio, conforme consta do planejamento do governo. Isto, além de necessário, atende à nova geração de leitores criada por sua implementação anterior no Ensino Fundamental. As crianças crescem, avançam na escola, tornam-se adolescentes e não podem ser privadas da leitura, em especial quando já se acostumaram a esse saudável hábito. Igualmente, é importante intensificar a inclusão digital, também decisiva para a prosperidade e competitividade do País.
Afinal, o Homo sapiens contemporâneo não pode dispensar quaisquer meios de acesso à informação, pois o poder da palavra e dos conteúdos é muito superior em relação à época retratada no romance de Humberto Eco e também ao ano de 1980, quando a obra foi escrita e no qual a internet não passava de ficção. Exemplo conclusivo: o número de textos científicos tem crescimento exponencial, dobrando a cada 40 anos, e só no ramo da física teórica, dentro de algum tempo haverá dez novos artigos a cada segundo, salienta Stephen Howking, em seu best seller "O universo numa casca de noz". Ou seja, o "nome da rosa" o conhecimento torna-se um conceito elevado ao infinito, exigindo foco preciso na identificação dos desafios da humanidade.



Editado por Giulio Sanmartini   às   7/07/2006 03:13:00 AM      |